SOCIEDADE SETUBALENSE

Como breve introdução pareceu-nos interessante transcrever alguns excertos de documentos coevos que nos mostram, de diversos modos, o descontentamento, fruto da tomada de consciência da injustiça social que então grassava entre os povos. Destacamos, no entanto, os portugueses e, especialmente, a população setubalense, pelas suas características no mundo do trabalho. Assim, o associativismo começou a ser o alvo preferencial para levar a bom termo a Revolução Social capaz de pôr cobro às graves desigualdades que atormentavam os mais desfavorecidos. Situações gritantes eram, então, transcritas por homens de letras e políticos das correntes revolucionárias, mais ou menos moderadas, que manifestavam a revolta sentida, através das suas obras."E os pobres? porque é que os pobres sofrem sem gritos, revolvidos como a terra por este arado - a dor? Só vêm a este mundo para sofrer? O gabiru via-os cheios de resignação seguirem o caminho da vida, cada um com sua cruz, feridos nas pedras aspérrimas, sem pão, escarnecidos, tombando por terra sem poderem mais".(Raúl Brandão, Os Pobres, Lisboa, 1925, p. 204)"Falamos dos fuzilamentos de Ovar, e da horrível tempestade que assolou as margens do Tejo, reduzindo centenares de famílias à miséria e à fome! [...] Quem foram as vítimas [...]? Os pescadores. [...] Quem sabe se virá perto o dia, em que os soberbos serão humildes, e em que os escravos serão senhores!...Então ai daqueles que sorriram das lágrimas do povo! Ai daqueles que se embriagaram no seu sangue! Ai daqueles que se vestiram de galas na sua morte!"(O Facho, Lisboa, 1870, p. 28, p. 30 e p. 31.)
Povo! consentesQue ainda te escarrena cara a corjade repelentes?!...(A. J. L. Pereira de Carvalho, "A crápula burguesa", O Emancipador, Porto, 17 de Dezembro de 1892.)"Encanto e saber profundolevam a Humanidadeao caminho da verdadepara deslumbrar o mundo(Libertas, "Arte e Ciência", O Fadinho (dirigido por José Carlos Rates), Setúbal, 28 de Julho de 1910, p. 3)"É ou não caros senhoresCada dia com seu santo?É preciso haver portanto,Dia dos trabalhadores..."[...](Jules Guedes, in Vergueiro, "Rebarbando", O Eco Metalúrgico, Lisboa, 1 de Maio de 1896.)"Bendita sejas tu, AssociaçãoTemplo de amor, és um sagrado altar,Onde a luz da razão hão-de encontrar,Os povos da futura geração.Bendita seja a grande multidãoQue passa a vida sempre a labutar,Mas que há-de a tirania derribarE acabar com a infame escravidão!Para nos conduzir a nova estradaEu vejo despontar uma alvorada,Que há-de vir transformar a sociedade.Quando nós nos unirmos, companheiros,Será então a vida para os obreiros,Feita de Paz, Amor e Liberdade."(Pereira Ramos, "A associação", O Fiandeiro, Porto, 1 de Maio de 1910.)Associações de classe e de assistênciaGénese do movimento associativoOs símbolos da liberdade e da uniãoComo sabemos, para os trabalhadores dos finais do século XIX e do início do século XX, o 1º de Maio e a associação, símbolos da liberdade e da união, eram as únicas armas capazes de transformar a velha e caquéctica sociedade, fazendo desabrochar uma nova era, onde a Justiça Social e a Solidariedade não fossem palavras vãs: "[...] É a noite que desaparece, é o passado que se amedronta; deixá-los: Na âmbula do oriente surde a aurora de um novo dia e os primeiros homens livres podem respirar desafogados sobre a terra livre - a mãe comum".Mas as palavras liberdade e associação são tão antigas quanto o ser humano. Ao longo da História elas foram sempre expressão do sentir dos mais desfavorecidos e escravizados e da necessidade de ultrapassar situações de ruptura entre o poder instituído e a população que lhe servia de sustentáculo. "Enquanto a nobreza vivia envolvida em guerras familiares de objectivos espúrios, o trabalhador produzia no campo e na fábrica [...]. Entre as ‘revoltas e os motins’ a plebe trabalhava e morria de fome". Havia pois que diligenciar maneira de obviar tais situações, através de associações como irmandades religiosas, confrarias e agrupamentos de artífices e de outras profissões que asseguravam aos associados cuidados indispensáveis para a sua sobrevivência, embora em condições claramente infra-humanas.


O movimento operárioSetúbal, cidade operária por excelência, como já foi referido, viveu momentos de agitação social de grande importância para o país e sofreu também a influência do processo nacional, influenciando-o ao mesmo tempo. Assim, embora pareça despropositada a extensão deste texto introdutório, não podemos deixar de o fazer, sob pena de incorrer em lacunas graves ao descrevermos a situação setubalense.As revoltas, os motins e as revoluções que se verificaram nos últimos séculos fizeram germinar o conceito de Justiça Social que chegou ao nosso país, onde cresceu e deu fruto. Desde o início do século XIX que, em Portugal e especialmente em Setúbal, se verifica um movimento irresistível que pretende abalar as estruturas sociais radicadas para imprimir uma nova dinâmica ao seu futuro. As associações exercem o seu papel, embora de início puramente assistencial. Assim, em 1807 os operários arsenalistas fundam um montepio, iniciativa que foi seguida por muitos outros trabalhadores. O ambiente laboral não oferecia segurança ao Governo desde o raiar de Oitocentos, uma vez que os acontecimentos desencadeados pelos operários, sob a influência socialista misturada com as ideias anarquistas de Proudhon, traziam a insegurança ao sector económico nacional. Neste contexto, Silvestre Pinheiro Ferreira fez publicar em 1814 a sua obra intitulada Memórias Políticas sobre os Abusos Gerais e Modos de os Reformar e Prevenir a Revolução Popular . No entanto, a Revolução Liberal de 1820 mudou o rumo da História e o povo manteve sempre firme o seu propósito.Em Agosto de 1833, Agostinho José Freire tenta fundar uma Caixa Económica, em Maio de 1834 são abolidas as corporações e proclamada a liberdade de trabalho. Os comerciantes associam-se e, em Junho de 1834, é criada a Associação Comercial de Lisboa, seguida da sua congénere do Porto, em Dezembro do mesmo ano .A luta de classes radicaliza-se. "Passos Manuel, advogado e político liberal, defende o uso dos artigos nacionais e cria conservatórias de artes e ofícios em Lisboa e Porto, por decreto de 18-11-1836 e 05-01-1837, lançando as bases para o ensino profissional. Conquanto fossem um passo em frente, estas criações não atendiam àsnecessidades do trabalhador das indústrias e muito menos do campo, que continuava em situação de completo atraso económico e cultural. Até eles, quase não havia chegado a escola". Em contraposição, o trabalho infantil institucionalizara-se". Esta situação, que se manteve ainda no século XX, era agravada pela ausência de assistência social, quer no referente a acidentes de trabalho, quer na doença e mesmo na velhice. As associações operárias de assistência, que tinham como objectivo dar apoio na doença, no desemprego e em caso de morte dos seus associados, eram em número insignificante (em 1856-1857, existiam no país 85, com cerca de 30 000 associados) e eram sustentadas apenas pela quotização dos próprios operários, pois o "Patronato e o Governo não tinham obrigações além das de explorar até às últimas consequências o trabalhador, enquanto tivesse saúde!".A imprensa de raiz popular alertava para as carências sociais dominantes, tendo, em Abril de 1838, nascido em Lisboa o jornal intitulado O Procurador dos Pobres e em Dezembro o Defensor do Povo, folha artística semanal. A efervescência política conduz à instabilidade económica. Em Outubro de 1840, Silvestre Pinheiro Ferreira publica um "Projecto de associação para o melhoramento das classes industriosas" e realiza-se a Exposição Industrial Portuguesa. Mas, em Agosto de 1843 circula clandestinamente O Regenerador, em Dezembro de 1844 João Maria Nogueira cria a "Biblioteca do Socialismo, ou Excertos àcerca do Pauperismo da Organização Social, constituída por uma série de brochuras de 16 páginas". e é publicada a tradução da obra de Lamennais intitulada A Escravidão Moderna. Em Maio de 1845 a Associação Industrial Portuense edita O Industrial Português e, em Abril de 1846 eclode o movimento anticapitalista Maria da Fonte, seguido da Patuleia; neste mesmo mês funda-se a Caixa de Socorros da Imprensa Nacional. Em Abril de 1848 aparece em Lisboa o jornal republicano A Fraternidade, sai o primeiro número de O Eco Popular e edita-se A República, considerado como o jornal do povo. Em Julho de 1849 começou a publicar-se em Lisboa o periódico A Emancipação, Francisco Vieira da Silva propaga os princípios associativos através de uma campanha na revista Revolução de Setembro e realiza-se em Lisboa uma exposição industrial. Em Abril de 1850 começa a editar-se O Eco dos Operários e em Julho funda-se a Associação dos Operários de Lisboa. Em Dezembro deste ano existiam já em Portugal 26 associações mutualistas.Entre 1820 e 1850 assistira-se à formação e consolidação de novas estruturas laborais, associadas ao regime político que se institucionalizara. À proclamação da liberdade do trabalho seguiram-se as primeiras propostas de associativismo, com o Projecto de Seguro Mútuo dos Empregados Públicos, da autoria de Silvestre Pinheiro Ferreira e com a fundação da Sociedade de Artistas Lisbonenses. A partir de 1839, o processo social era o fruto da interpenetração de um cristianismo social e de um socialismo lamennaisiano que deu origem ao desabrochar de novas ideias, seguidas de novas propostas que visavam um relacionamento social menos discriminante.A partir de 1850 assistimos à repercussão dos ideais definidos pelos primeiros teóricos do associativismo no seio das classes trabalhadoras. Entre 1852 e 1870, a expressão característica do movimento operário foi a mutualidade nos seus múltiplos aspectos. Em 1855 fundou-se em Setúbal a Associação das Classes Laboriosas . Os conflitos laborais eram raros e, sempre que ocorriam, eram abafados pelas vias legais. As necessidades sentidas pelos trabalhadores, na área da saúde, da instrução e dos socorros, entre muitas outras, eram aceites pelas classes detentoras do poder que tentavam resolvê-las a contento de ambas as partes. Mas o ano de 1870 surge e, com ele, assiste-se a uma ruptura radical nas relações sociais, verificadas em Portugal, afectadas pelas consequências da Comuna de Paris e da filiação do operariado organizado na Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT). Desde então, os trabalhadores portugueses insurgiram-se contra as ideologias integradoras, sem excluir a republicana, recusaram o reformismo e o legalismo anteriores e lançaram-se audaciosamente contra a "exploração capitalista". Mas a crise de 1876 alterou o ritmo de crescimento do capitalismo no nosso país. O movimento operário português envereda pela particularização das lutas, pelo isolamento internacional e pela teorização das especificidades nacionais. O desaparecimento da AIT conduz à hegemonia dos sociais-democratas e a uma quase inactividade do movimento operário.Com a aproximação dos anos 1890, a situação altera-se. A partir de 1887 reacende-se a pressão dos conflitos laborais, iluminados por uma complexa trama ideológica: conservadores, possibilistas, anarquistas e sindicalistas, sem esquecer os socialistas de Estado, o operariado católico e os trabalhadores republicanos. Reaparecem as organizações de trabalhadores, os jornais proliferam, as doutrinas anarquistas são ouvidas atentamente. Em 1890 o operariado português comemora, pela primeira vez, o 1º de Maio como a festa do trabalho e do trabalhador. Até ao final do século crescem a necessidade de associação sindical e as reivindicações operárias, registando-se, em Dezembro de 1890, as greves dos operários da indústria do têxtil de Lisboa e dos soldadores de Lagos; em Março de 1891 a promulgação da lei sobre a jornada de oito horas de trabalho para os operários tabaqueiros, da autoria de Augusto José da Cunha; em Abril deste mesmo ano a publicação de um decreto-lei que revoga as disposições de 1890 sobre a duração do trabalho dos menores; em Maio um decreto publicado com a data de nove regula a formação das associações de classe; em Junho funda-se no Porto o Centro Operário de Propaganda Socialista e, em Setembro, realiza-se na Caixa Económica Operária, em Lisboa, um congresso sindical, a que se seguem algumas greves e manifestações operárias. Em Março de 1893 um regulamento de Bernardino Machado regulamenta o trabalho das mulheres e dos menores, a que se seguem algumas greves e aprovação de estatutos de associações de classe de que salientamos, em Julho de 1893 a aprovação dos estatutos da Associação de Classe das Lavadeiras de Lisboa. Em 1894 o decreto de 31 de Janeiro dissolveu as Associações Comercial, Industrial Portuguesa e dos Lojistas de Lisboa. Neste ano registaram-se várias greves, constituiu-se a Confederação Metalúrgica, que agrupava 19 sindicatos e a Sociedade Voz do Operário contava já com 11 000 associados. Em Outubro de 1895 realizou-se em Tomar o Congresso do Partido Socialista Português (PSP). A partir de então, a cidade de Setúbal movimenta-se, aparecendo várias referências a actividades ligadas aos trabalhadores. A estas e outras manifestações de descontentamento, por todo o país, juntaram-se congressos operários, outras inaugurações de cooperativas, publicação de novos jornais, entre outros.Com a aproximação do século XX, assiste-se a uma nova fase do movimento operário português. São dez anos de ininterrupta formação de associações de classe, de realização de congressos corporativos e pluriprofissionais e ainda de constituição das primeiras federações sindicais, que modificaram o desenrolar da organização operária em Portugal. A coroar os esforços despendidos por esta geração de lutadores operários surge o jornal sindicalista revolucionário A Greve, em Março de 1908, na cidade de Lisboa e ainda a significativa vitória sobre os sociais-democratas em Julho de 1909, com a celebração do Congresso Sindical e Cooperativo. Então, em Setúbal, assiste-se a um desusado movimento no seio dos trabalhadores e, simultaneamente, entre as instituições patronais.De 1909 a 1919 decorre um período que poderemos considerar como o mais animado da história do movimento operário português. A revolução de 5 de Outubro de 1910 justifica-o plenamente. Naquela década verificamos um desenrolar contínuo dos acontecimentos, uma vez que cresce o efectivo dos militantes inscritos nas organizações operárias, ao mesmo tempo que se assiste a um desfecho vitorioso das lutas desencadeadas pelos trabalhadores, até ao dealbar dos anos 1920. Ao longo destes anos, verificamos também a existência de um processo descontínuo, uma vez que as estruturas reorganizativas se transformaram qualitativamente com a criação das organizações de sindicatos, a constituição da União Operária Nacional, central sindical única, e a sua transformação, em 1919, em Confederação Geral do Trabalho.Ainda antes da revolução, verificaram-se em Portugal inúmeras greves (trinta e um conflitos em 1909), e congressos operários como o Congresso Nacional Operário, organizado pelos socialistas, em Janeiro de 1910. Proclamada a República, os conflitos multiplicaram-se e, 1911, foi um ano quente em conflitos laborais. Em Janeiro de 1913 forma-se o núcleo das Juventudes Sindicalistas, em Abril, durante uma sessão de propaganda sindicalista são presos os militantes Carlos Rates (operário conserveiro na cidade de Setúbal) e António Henriques; em Dezembro, o PSP adere à II Internacional. Os incidentes laborais, os congressos revolucionários e a proliferação de grupos anarquistas, anarco-sindicalistas e socialistas continua, até que 1920 surge e, simultaneamente, uma nova era começa na dinâmica do movimento operário em Portugal. "É durante os anos de 1919 e 1920 que a capacidade de luta e mobilização dos trabalhadores portugueses atingirá o ponto mais elevado. O zénite da combatividade poderia situar-se durante todo o primeiro semestre de 1919, na altura precisa em que o capitalismo se vê obrigado a ceder ao movimento operário uma série de aquisições de importância capital" . Mas, todas as conquistas do operariado, conseguidas com sacrifícios incalculáveis, não chegaram a ser lei, pois a sua publicação no Diário do Governo, jamais se concretizou plenamente. Para esta situação contribuíram a depressão do pós-Guerra, o enfraquecimento económico das classes operárias, a repressão policial, a repetição sistemática dos conflitos de trabalho, levados muitas vezes à exaustão, repetindo-se sem bases sólidas. Em contrapartida, a resistência burguesa organizava-se e, pouco a pouco, tomando posições de força, encaminhou a solução da crise política e social de modo a sair vitoriosa. Os maximalistas e os comunistas perceberam a situação, tentaram uma dinâmica nova mas foram mal sucedidos. "Quando em 1926 o triunvirato submete o país à ordem militar, mais de dois terços da organização sindical tinham já sido dispersos pelas vagas de repressão de Cunha Leal, Granjo e António Maria da Silva. Em Janeiro de 1934, o capitalismo português pode, sem dificuldade, desferir o golpe de misericórdia nas organizações operárias. Não era a CGT de 1919 que o corporativismo vinha desalojar das antigas sedes sindicais. Era um montão de destroços que a tão democrática República de 1910-1926 deixara sem fôlego para reagir"..Os sindicalistas e os outros operários ficaram exaustos. Ao desalento que a derrota causou, juntavam a tranquilidade que lhes transmitia o facto de terem cumprido o seu dever. Assim, Emídio Santana em Tempos de luta, de adversidade e de esperança (memórias de um militante anarco-sindicalista) - 1912-1983, conclui: "Na avaliação da minha experiência, dos acidentes de percurso, do que afinal é o conteúdo da minha vida nada tenho a rectificar de meu conceito anarquista da vida e da sociedade. Sinto felicidade de não ter vivido ao acaso, ao sabor do tempo e das circunstâncias, de ter sido de algum modo actor e não espectador" . Afirmação idêntica foi feita por Alberto do Vale (já citado), soldador setubalense e anarquista convicto, aquando da nossa entrevista.Associações de classe
Sua afirmaçãoApós a revolta do 31 de Janeiro de 1891, quando, no mês de Maio, o Banco Lusitano e o Banco do Povo suspendiam pagamentos, a Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, a Mala Real Portuguesa e outras empresas se encontravam em situação angustiante, a libra tinha atingido um câmbio de 2 000 réis e o fundo português se mantinha em Londres a 42,87, o Governo do general João Crisóstomo de Abreu e Sousa, ao defrontar-se com a proliferação de associações de classe, mesmo sem a existência de um documento legal que as autorizasse e o artigo 282º do código penal proibisse associações de mais de vinte pessoas, que não fossem previamente autorizadas, decidiu "regulá-las", após ter publicado o decreto que definia a Organização das Associações de Socorros Mútuos, aprovado em 28 de Fevereiro desse mesmo ano. Era uma maneira de obviar as dificuldades com que os trabalhadores se defrontavam e, perante o desagrado geral, criar condições propícias a um ambiente menos tenso, permitindo a organização dos operários. Aliás, algumas dessas associações de comerciantes, de industriais, de agricultores, de empregados ou de operários, possuíam já estatutos aprovados pelo Ministério das Obras Públicas Comércio e Indústria, enquanto que outras os haviam submetido à apreciação do Governador Civil do respectivo distrito administrativo e várias existiam sem autorização legal, "por tolerâncias das autoridades". Então existia já a Fraternidade Operária, "associação que, em 1872, iniciou a organização do operariado no nosso país [...]. A esse movimento ligaram o seu nome imperecivelmente, entre outros, Antero de Quental e José Fontana". Algumas vezes as associações de classe organizavam-se como associações de socorros mútuos, "inscrevendo nos estatutos, além dos preceitos relativos à mutualidade, outros alheios a ela, confundindo numa instituição única, atribuições completamente diversas". Esta indefinição agravou-se com a aprovação do decreto de 28 de Fevereiro de 1891 que considerava "associações de socorros mútuos unicamente as instituídas para qualquer dos fins indicados no artigo 1º do mesmo decreto e proibiu que nas respectivas assembleias gerais se discutissem assuntos alheios aos fins designados nos estatutos" . Assim, no projecto do decreto de 9 de Maio de 1891, "sob a denominação genérica de associações de classe foram compreendidas [...] as sociedades compostas de mais de vinte indivíduos, da mesma profissão ou de profissões correlativas, tendo por fim o estudo e a defesa dos interesses profissionais que lhes são comuns, abrangendo-se assim as associações comerciais, industriais ou agrícolas, quer sejam compostas só de patrões (comerciantes, industriais ou lavradores), só de empregados, operários ou trabalhadores rurais, ou mistas".O legislador considera que estas associações poderão ser muito úteis, não apenas através da resolução dos problemas da classe como ainda fornecendo aos poderes públicos elementos importantes para a correcta resolução de problemas de ordem económica, de ordem social ou de ordem técnica. Por isso, o decreto estabeleceu para estas associações o "direito de se ocuparem dos assuntos relativos ao estado, condições e necessidades da sua indústria ou do seu comércio e modo de o desenvolver, à situação do respectivo pessoal e maneira de melhorar as suas condições sociais, à higiene e segurança nos trabalhos industriais". O documento previa também "a obrigação de funcionarem como corporações consultivas, dando parecer sobre os assuntos da sua especialidade acerca dos quais fossem consultadas pelo Governo" . Uma salvaguarda ficava bem clara no texto introdutório: Estas associações deviam ocupar-se unicamente dos interesses profissionais, "mantendo-se alheias à política", tornando-se assim "elementos de ordem e de progresso" .No que se refere a reuniões ou congressos, o documento não contem qualquer legislação, remetendo-os para "as disposições gerais que regem o exercício do direito de reunião". Sempre com o mesmo espírito, o legislador termina o preâmbulo do documento com um apelo ao Rei para que o aprove pois considera que o Governo ao promover a legalização da organização de associações "cria coadjuvantes para futuras resoluções"."[...] Entretanto, no alvorecer do século XX, o movimento associativo em Setúbal esboceja já os ensaios dos seus primeiros passos [...]. Dentro da primeira década desse século as associações de classe tomaram tal incremento que tornaram o meio operário setubalense em baluarte de reivindicações sociais. Tempo houve em que a febre associativa, em Setúbal, constituía como que uma brotoeja que se propagava a vários núcleos representados pelas classes operárias. E assim as associações surgiram como guarda avançada das regalias operárias mas... quantas vezes traindo os princípios ideológicos da sua verdadeira missão, [...]". Luiz Silveira considera que nos quinze anos que se sucederam à implantação da República em Portugal os movimentos grevistas que se verificaram em Setúbal foram uma consequência lógica da mentalidade operária que pontificava nos agrupamentos associativos. "Greves revolucionárias, tumultuosas, desencadeadas por cálculo e conveniências de natureza política. Por vezes esses movimentos desordenados das associações de classe não se justificavam nem tinham cabimento. Era o delírio de uma época de reivindicações que tomaram vulto [...]", conclui o autor em plena época corporativista que considera de "acalmia dos espíritos mais revoltosos das classes operárias; e metodicamente, uma transformação de ordem associativa se verificou vagarosa, é certo, mas segura na sua marcha [...]" .
Associações Patronais
Inseridas no movimento associativo, que em Setúbal começara a dar os primeiros passos, desde 1835 que as entidades patronais pensaram em associar-se, não apenas para se defenderem das reivindicações operárias, ainda débeis, mas também para organização do mercado interno local, das relações com o exterior e ainda da protecção contra a concorrência, destrutiva dos interesses da classe. Pela antiguidade deste movimento, decidimos falar em primeiro lugar das associações patronais e só depois das associações laborais que, em Setúbal, apenas iniciaram os primeiros passos em 1855, com a fundação da Associação das Classes Laboriosas. Isto porque ambas nasceram pela mesma razão: afirmação do capitalismo com todas as suas consequências, quer para os patrões, quer para os trabalhadores, embora estes fossem sempre os mais afectados.Divergências entre patrões e operários


AV. LUIZA TODI NO SÉCULO XIXNo dia 25 de Agosto de 1907 começou a vigorar em Setúbal o decreto governamental que instituiu o descanso semanal ao Domingo. O Independente, numa local de primeira página, tece considerações sobre esta determinação e o articulista, embora se declare apologista do descanso ao Domingo, relata as suas desventuras no primeiro dia de descanso obrigatório. Para ele, aquele Domingo foi "aborrecido e um tanto ou quanto tristonho" porque "se para matar a sede" quis "tomar um capilé", teve "de comer um bifetek"; se quis tomar uma cerveja" foi "obrigado a comer uma galinha, enfim se decidira "gastar 60 réis, o descanso dominical" obrigou-o "a gastar 200 réis" e conclui: "descanso assim não é descanso, é uma roubalheira". Em causa estava realmente não o descanso do pessoal, mas o facto de não ser permitido beber algo sem que a bebida fosse acompanhada de um "petisco", facto que evitava o descanso de mais gente. Por seu turno, o encerramento das tabernas ao Domingo também, segundo o autor, não resolvia o problema, pois quase todas tinham uma mercearia anexa, através da qual continuavam a vender o vinho; e, por outro lado, os viciados, sabendo as tabernas fechadas no Domingo, bebiam muito mais no Sábado, trazendo à cidade espectáculos pouco dignificantes nesta noite. Em seu entender, os principais prejudicados eram os pacatos trabalhadores que faziam da taberna o seu clube, a Câmara que perdia os impostos provenientes das "centenas de litros de vinho que se deixavam de vender em cada Domingo [...] e ainda os pobres taberneiros, que [...] ao Domingo faziam o seu melhor negócio". Outro problema que se colocava era o das barbearias, mas nesse caso o Governador Civil permitia que abrissem, uma vez que era ao Domingo que os homens faziam a barba e se penteavam para estarem mais apresentáveis nos divertimentos a que iriam assistir e porque também era neste dia que se deslocavam à cidade para o mesmo efeito os trabalhadores rurais das imediações.O assunto continuava a ser debatido sem que os intervenientes se entendessem, pois, consideravam haver na lei "uma porta falsa" que, permitindo várias interpretações, provocava "reclamações, exigências, o inferno enfim, que foi o que o decreto veio trazer, especialmente a Setúbal, cidade ordeira e laboriosa que tantas atenções merece". Em Setúbal, quase todos os comerciantes preferiam descansar ao Domingo, enquanto que em Palmela e Azeitão dominava o desejo de parar as actividades à Quinta-Feira. Esta discordância iria afectar Setúbal, uma vez que a freguesia de Palmela se estendia até ao Rio da Figueira, então já inserido na cidade. Segundo o articulista do Independente teria sido bem mais fácil que fossem os trabalhadores a decidir e não os patrões, pois que estes prefeririam descansar ao Domingo. Assim, como os patrões colocavam sempre os seus interesses em primeiro lugar, não se tornava fácil a resolução da questão. Perante o impasse, o Governador Civil decretou que, em Setúbal e resto do concelho, o descanso fosse à Quinta-Feira, ignorando que, nesta cidade, existiam fábricas de conservas que não podiam parar a laboração nesse dia. Assim, o comércio e a indústria de Setúbal protestou contra aquela decisão unilateral e a própria Câmara deliberou "apelar da sentença e pedir novas providências". Analisadas, separadamente, as várias hipóteses e opiniões, foi determinado que em Setúbal os estabelecimentos encerrariam ao Domingo, exceptuando as tabernas, as casas de pasto e as barbearias que teriam o seu dia de descanso à Quinta-Feira, conjuntamente com o comércio de Azeitão e de Palmela.Sessenta tendeiros fizeram, então, uma exposição ao Presidente da Câmara, a pedir autorização para abrirem os seus estabelecimentos ao Domingo; alguns insurgiram-se contra a autorização mas sessenta e um destes pequenos comerciantes abriram os seus estabelecimentos. Também os barbeiros se dividiram, embora a maioria preferisse fechar ao Domingo à tarde, situação que foi analisada com a salvaguarda de o patronato se comprometer a dar aos seus empregados um dia de descanso quinzenal, por turnos. Mas a classe não se entendia, chegando alguns a tentarem abrir as suas casas à Quinta-Feira, contra a decisão do Governo Civil. O Presidente da Câmara, que se empenhara em ajudar os barbeiros, decidiu esperar até que estes chegassem a acordo e então interceder pelos seus desejos. A classe continuava desunida e fazendo o seu horário, sem respeitar as deliberações legais, facto que levou a imprensa a tecer as suas críticas. O Governo, tendo em conta algumas reclamações consideradas justas, elaborou um documento onde incluía algumas ressalvas à lei de 7 de Agosto. As alterações introduzidas referiam-se a exposições, museus, agências de informações ou colocações e aos estabelecimentos que vendiam selos, fórmulas de franquia, tabacos, fósforos ou gasolina e ainda os cafés bilhares ou botequins. As mercearias que vendessem habitualmente artigos de pastelaria e confeitaria também ficavam abrangidas pela nova legislação mas apenas para a venda destes produtos. As localidades onde se realizavam feiras ou romarias ficavam isentas do cumprimento da lei nesses dias.Em cada localidade, o Governador podia decidir sobre o descanso por turnos no referente a estabelecimentos com empregados. Aos donos ou empresários de casas de fotografia era autorizada a escolha de um dos dias indicados na lei para descanso do pessoal, comunicando a sua escolha ao Governador Civil. Não era obrigatório o descanso semanal para o pessoal das empresas teatrais e para os acendedores da iluminação pública. No referente às decisões tomadas pelas Câmaras era possível proceder-se a recurso, "com efeito suspensivo para a respectiva estação tutelar" .Em 1911 o problema mantinha-se. O Alvorada, "quinzenário defensor dos empregados de comércio e dos interesses da localidade", denuncia a fraude que era, em Setúbal, o cumprimento da lei referente ao descanso semanal obrigatório, uma vez que as autoridades raras vezes puniam os prevaricadores: "O descanso semanal nesta cidade é um mito, cumpre-o quem muito bem quer, sem respeito seja por quem for. Ainda no Domingo passado se deu, em pleno dia e nas barbas da polícia, uma desordem numa taberna de que resultaram ferimentos de certa gravidade" .A Cegarrega, "quinzenário humorístico e de caricaturas", comenta-o, referindo a opinião de um hipotético taberneiro: "Seja o encerramento à Quinta-Feira. Não. Prefiro ao Domingo. Ainda não. Talvez à Sexta-Feira... Não, não e não! Não quero encerramento. Viva a liberdade de comércio".Associações laborais
Como sabemos, estas associações iniciaram a sua actividade como instituições de socorros mútuos, com objectivos fundamentalmente filantrópicos, sem qualquer princípio de carácter sindical. Nelas, a consciência de classe e de luta pelos seus direitos não estavam presentes, embora o desejo de instrução, para pôr cobro à discriminação e aos desníveis sociais, fosse o embrião desse ideal que viria a manifestar-se alguns anos mais tarde. Na segunda metade do século XIX a religião continuava a ser ainda a principal transmissora da moral e dos ideais orientadores de grande parte das sociedades, que então se queriam mais libertas e fomentadoras de justiça social. Este novo conceito mudou as directrizes por que se regia a vida na que, em 1860, viria a ser a cidade de Setúbal. Nela se digladiavam, então, regeneradores e progressistas que tentavam moldar a seu jeito o modus vivendi das gentes que residiam nesta região, junto ao rio Sado. Como se pode verificar através de algumas afirmações contidas no relatório que acompanhava os Estatutos da Associação Setubalense das Classes Laboriosas, nascida em Abril de 1855 e patrocinada pelos militantes progressistas, "[...] as ideias democráticas propagam-se e progridem com força e rapidez", mas elas confundem-se ainda com os princípios de solidariedade pregados pelas Igrejas Cristãs e, nos textos que se nos apresentam, verificamos uma interpenetração dos ideais revolucionários e dos princípios religiosos, com expressões onde o sagrado e o profano se confundem, em conclusões onde o sacrílego e o piedoso se misturam de forma tão harmoniosa que, a realizarem-se, transformariam verdadeiramente as sociedades onde os seres humanos fossem capazes de as viver em pleno. A democracia era, afinal, a concretização do Evangelho de Jesus Cristo humanizado na revolução sociocultural que os socialistas defendiam. O autor do texto que atrás referimos, liberal convicto, incorpora a miscigenação destas duas forças, divina e humana, quando diz que, "quanto mais [as forças democráticas] se desenvolverem a par dos sentimentos religiosos mais se melhorarão as classes pobres e necessitadas. [...] Que Deus continue a protegê-las". Era a real utopia que jamais foi capaz de ultrapassar este estádio, por culpa do egoísmo humano, que provocou o aproveitamento político dos princípios preconizados em teoria. Os liberais abrem uma pequena fresta no bloco granítico que era então a sociedade setubalense (e não só), mas os interesses económicos da burguesia, mesmo a que se dizia afecta ao liberalismo, fecham-na novamente, deixando um vazio ainda maior no seio dos trabalhadores.A falência deste tipo de agremiações e o desenvolvimento de novas forças sociais fazem com que o proletariado se transforme, se instrua e se embeba em novos ideais, vindos de terras longínquas, fruto de grandes derramamentos de sangue, eivados de revolta e de vontade de vencer. Se o Amor que Cristo pregou não conseguiu abrir os corações dos detentores do capital, a Força era a única maneira de transformar o Mundo. Aos gritos de Liberdade, Solidariedade, Fraternidade e Igualdade juntaram-se novos conceitos como o de Justiça Social, Luta de Classes, Revolução Cultural, entre outros. Surgem, então, as "associações de classe", com objectivos bem diferentes das que, embora denominando-se de "associações de classes laboriosas", de "fraternal dos operários", de "sindicatos agrícolas", não passavam de simples associações de socorros mútuos como muitas outras. Em 1891, nasce em Setúbal a primeira associação de classe cujos Estatutos perseguem os novos objectivos. Foram os soldadores de Setúbal, operários mais instruídos e esclarecidos, que a fundaram, lançando a primeira pedra para a construção do associativismo revolucionário nesta cidade. A corrente ideológica que a orientava era a socialista, embora, ao longo da sua existência, fosse algumas vezes dirigida pelos anarco-sindicalistas. O Socialismo havia já iniciado a doutrinação nesta região, ainda que sem organização partidária reconhecida. No dia 5 de Fevereiro de 1900 surgiu o nº 1 de O Productor, "órgão da classe dos soldadores e do povo operário em geral", dito apolítico, mas reconhecido como um semanário socialista. Afirma-se sem programa mas acérrimo defensor "dos pequenos e dos humildes, sustentando os direitos das classes trabalhadoras que se propõe afirmar. Sustentará ideias, missionará princípios, discutirá instituições e doutrinas, mas não formará ao lado de nenhum grupo político local, - porque por igual está distante de todos . Isto não quer dizer que abominemos a política, ciência de administrar", conclui o articulista. O apelo à luta de classes encontra-se latente em todos os seus escritos, tal como, este mais explícito, o convite à associação de homens e mulheres que labutam nas fábricas de conservas de peixe em Setúbal, sendo explorados(as), oprimidos(as) e vilipendiados(as), principalmente elas, as maiores vítimas.O movimento associativo do operariado setubalense encontra-se em verdadeira ascensão, facto que leva o grupo dinamizador de O Productor a encher-se "de júbilo posto que comprova que os [...] irmãos na desdita despertam para a luta, - luta legal e pacífica, ordeira, mas luta tenaz em prol da dignidade do povo operário [...] um por todos e todos por um, eis a norma". O último número (nº 44) deste semanário publicou-se a 1 de Dezembro do mesmo ano. Mas no dia nove, tendo, tal como o periódico anterior, José dos Santos Nunes como editor e administrador, surge O Trabalho, "semanário da classe operária" que mantém os objectivos e princípios do seu antecessor mas assume já, claramente, a sua filiação partidária: Assim, os socialistas de Setúbal, filiados na chamada ala esquerda do PSP nacional, defendem a "reorganização do trabalho pela emancipação dos trabalhadores". No entender do autor do artigo, este objectivo só seria atingido se fosse dinamizada uma verdadeira revolução cultural. Ao longo dos vinte e um anos de vida os colaboradores deste periódico vão manter-se fiéis a estes princípios e fazer do seu semanário uma fonte cultural de elevado nível científico e pedagógico. A sua actividade desenvolveu-se em dois campos que, sendo distintos, se complementam: o cultural e o laboral que, número após número, se interpenetram de modo formativo e globalizante. Conscientes de que as palavras são muito importantes mas insuficientes para a resolução imediata dos problemas que afligiam os operários, fundaram a Sociedade de Instrução e Beneficência "O Trabalho" que, a par da função educadora dos seus associados, funcionava como uma associação de socorros mútuos.No dia 4 de Outubro de 1903, o grupo anarquista, radicado em Setúbal, iniciou a publicação de um novo semanário, intitulado Germinal, cujo lema era a máxima de Giordano Bruno "Diz sempre a verdade, ainda que ela te custe a vida", embora algumas vezes usasse também o subtítulo de "Semanário defensor dos oprimidos". À semelhança dos seus correligionário do resto do país, os anarquistas setubalenses (Martins dos Santos, Agripino Maia, Carlos Rates, José Bennedy, Manuel Envia, Afonso Ventura, José Quaresma, entre muitos outros), defendem a "Revolução Social" e a "intervenção directa" dos trabalhadores, apelando consecutivamente à greve e apoiando todas as reivindicações dos trabalhadores contra "[...] os zângãos da política e do capitalismo que devoram o mel da produção comum que não ajudam, sequer, a fabricar vendo apenas, quando vêem, como ele se fabrica com tão pesado e sobre-humano sacrifício", congratulando-se ainda com as atitudes dos dirigentes das associações operárias que não colaboram "em festas genuinamente burguesas, com enorme gravame para o seu conceito [...] pois apesar de todos os desenganos, apesar das ilusões dissipadas, a superstição política continua avassalando os cérebros e pervertendo as consciências, como se a lição dos factos não fosse de molde a convencer-nos de que, para triunfarmos na luta, temos de banir, de uma vez para sempre, essa rameira hedionda e pestilenta que se chama política [...]". Consideram que as eleições correspondem à subversão da verdadeira democracia pelo que a igualdade entre os sexos não se pode realizar através da concessão das capacidades eleitorais às mulheres mas convencendo os homens a afastarem-se das urnas pois que "o voto só serve para servir os exploradores do povo".O grupo anarquista em Setúbal divide as suas opiniões quando se trata do apoio à República recém-nascida. Assim, quando, em Janeiro de 1911, José Carlos Rates se insurge contra a colaboração que as classes operárias dão aos capitalistas ao participarem nas suas festas, promovendo a consecução dos seus objectivos (e dá como exemplo a solicitação feita pelos políticos setubalenses às associações de classe desta cidade para que se juntassem a eles no protesto contra "o desvio projectado pelo Governo, da linha férrea do Vale do Sado", porque excluindo a "classe dos condutores do sal", nenhuma outra beneficiava com a proposta), Martins dos Santos, director do semanário, em N. R. diz concordar com todas as observações de Carlos Rates excepto no que se referia à questão do caminho-de-ferro do Vale do Sado. A cisão vislumbrava-se já e veio a culminar em Agosto, quando apareceu, como director do Germinal, António Evaristo e, como editor e redactor principal, José Carlos Rates que acusava a República de continuar, tal como a Monarquia, a perseguir todos os cidadãos que não eram militantes do partido do Governo. Martins dos Santos afasta-se da direcção do Centro de Propaganda Germinal e este, por falta de acordo com o anterior proprietário do jornal, inicia a publicação de um novo semanário sob o título A Revolta. Em 2 de Setembro, o Germinal volta a publicar-se normalmente e, no dia 9, Martins dos Santos retoma a direcção. José Carlos Rates, Leonardo Pereira e Francisco Rosado, que haviam estado na redacção e administração do semanário, deixam de ter qualquer responsabilidade na sua edição.Como se pode verificar através da imprensa local, socialistas e anarquistas, ou antes anarco-sindicalistas, comandavam a luta dos trabalhadores na cidade de Setúbal, tentando impor os seus conceitos de sindicalismo, à semelhança do que se passava em outros centros industriais do país, mas com muito maior pujança uma vez que aqui se situava o maior núcleo Anarco-Sindicalista português. Tal facto valeu-lhe o título de "Barcelona Portuguesa", tal como já referimos.As associações de classe e o 1º de Maio em Setúbal"A escolha do I de Maio como afirmação de solidariedade operária seria duma ironia pungente se não revestisse aspectos de revolta. Maio é o mês em que, por excelência, a Natureza se revela mais exuberante e formosa. E na vida proletária só há uma quadra:- a tenebrosa noite da miséria [...]"("I de Maio", Germinal, 1 de Maio de 1910, p. 1.)O primeiro dia de Maio foi, desde longa data, dedicado à natureza, à alegria, à liberdade e à união de todos os seres. As populações dirigiam-se aos campos para agradecer a Deus a vida e a liberdade e ainda como símbolo do abraço fraterno entre todos os elementos da Humanidade. Que melhor dia poderia existir para as manifestações operárias que desejavam repor esta harmonia perdida, quando a exploração do homem pelo homem veio trazer riqueza a uns e miséria à maioria das populações que se dedicavam ao trabalho? Esta situação favoreceu o aparecimento de ideologias defensoras dos não privilegiados, e o dia 1º de Maio passou a ser um dia de luta pela reconquista das regalias perdidas.Assim, na sequência das determinações do Congresso Socialista, realizado em Paris no ano de 1889, os trabalhadores continuaram lutando pela distribuição das 24 horas do dia por três funções diferentes, indispensáveis ao bom funcionamento psico-fisiológico dos seres humanos: oito horas para trabalhar, oito horas para estudar e oito horas para descansar. Em Portugal assistiu-se às primeiras manifestações no ano de 1890, nas cidades de Lisboa e do Porto, cujo exemplo foi seguido noutros centros industriais. Em Setúbal, encontramos os primeiros registos de manifestações operárias no dia 1º de Maio desde 1893, embora já em 1890 os trabalhadores da cidade se solidarizassem com os seus companheiros da capital, realizando passeios ao campo, com filarmónicas, farnéis e discursos sobre as determinações do congresso acima referido, no qual esteve presente Manoel Luiz de Figueiredo (que veio a ser Director do semanário O Trabalho de Setúbal), com Viterbo de Campos, em representação dos trabalhadores portugueses. Mas o ano de 1893 trouxe à cidade sadina novidades propiciadoras de mudanças na mentalidade dominante e, consequentemente, no movimento operário setubalense. No dia 30 de Abril, O Echo de Setúbal, "semanário republicano", cujo Director e Proprietário era Felisberto Simplício, dedicava o seu artigo de fundo ao 1º de Maio em Setúbal e recordava que este dia fora escolhido em 1884 pela "associação Labor Union, dos Estados Unidos, para as elevadas manifestações a favor do dia normal de 8 horas de trabalho [...] [Esta revindicação havia] de triunfar porque é justa, porque é sublime. Pois que [não se pode] admitir que uma enormíssima maioria que tudo produz esteja sacrificada a uma ínfima minoria que nada faz. [...] Mas para isto se conseguir era preciso fazer uma revolução na sociedade, era preciso mudar o sistema de assistência pública, substituindo a justiça solidária, à caridade humilhante". Neste artigo, o socialista Carlos Calixto considera que "socialistas e republicanos combatem [...] o mesmo inimigo comum [e que os republicanos] se sentem bem ao lado dos socialistas". Então, foram distribuídas em Setúbal duas folhas volantes, uma elaborada pelos socialistas e outra pelos anarquistas, nas quais se esclarece os trabalhadores sobre as ideias que cada um dos grupos defende, que em quase nada diferem. Os anarquistas terminam o comunicado com a seguinte frase:" O dia 1º de Maio não deve ser um dia de festa, deve ser um dia de agitação revolucionária, que deverá continuar-se pelo maior espaço de tempo que ser possa. Para a conquista das oito horas? Não, que isso seria pouco e mesquinho. Mas para a nossa emancipação, que está no termo destes movimentos parciais". Na folha distribuída pelos socialistas encontramos como ideia básica a defesa da instrução e também a luta, embora com palavras mais moderadas: "A sociedade actual baseia-se na ignorância e no privilégio. Façamos luz no cérebro dos nossos companheiros e destruiremos as trevas, destruamos o capital e teremos derrubado o privilégio. Levantem-se as multidões dos legionários de amanhã e comemorem o dia de hoje, como a data redentora que vem dessedentar os sedentos de justiça" .Os Conservadores setubalenses, por seu turno, esforçaram-se por retirar ao 1º de Maio a carga ideológica que os partidos de vanguarda pretendiam vincular-lhe e descreviam as actividades deste dia como culto da Natureza, no qual todos, ricos e pobres se deslocavam ao campo, para desfrutar a sua beleza. Mas, neste 1º de Maio, as associações de classe dinamizaram as atenções. Almeida Carvalho, regenerador e católico, ao falar das celebrações do 1º de Maio na cidade de Setúbal, relatava os acontecimentos, em que os trabalhadores tiveram lugar de relevo, pois participaram em festas e reuniões que decorreram com "ordem e sensatez". No texto por este produzido pode ver-se claramente a intenção de aliviar a carga ideológica que os trabalhadores imprimiram à comemoração, quando diz que, em Setúbal, não eram apenas as ideias socialistas que abrilhantaram aquele dia, cujo patrono era S. Filipe. O povo costumava, então, ir pelos campos fazer "piqueniques", discursar e depois passar pela capela, existente na fortaleza de S. Filipe, para rezar e entregar a sua oferenda. Não deixa, no entanto, de reconhecer que as celebrações daquele 1º de Maio tiveram motivações bem diferentes, uma vez que os operários foram movidos por ideias socialistas, tónica dominante das actividades desenvolvidas. A Associação Operária inaugurou uma escola e um gabinete de leitura; a Associação dos Soldadores realizou uma sessão solene e inaugurou outra escola. Foi então que discursou Angelina Vidal, entre outros socialistas e sindicalistas, locais e nacionais. Almeida Carvalho comentava, acintosamente, a intervenção de Angelina Vidal com a seguinte frase: "Discursou entre operários, propagando o Socialismo e proclamou a guerra ao capital, isto é - tornando-se uma imitadora da conhecida revolucionária Luiza Michel que, na França e onde [podia] pregar, [difundia] as suas ideias subversivas contra a actual organização social".Em 1894 o dia voltou a ser comemorado, tendo sido distribuído pelos operários o "Manifesto da União Operária" que tenta reacender o espírito da Internacional, através do apelo à luta pelas oito horas de trabalho que a faz renascer, "levantando num mesmo pensamento as legiões proletárias do velho e novo mundo". O apelo à unidade é feito através dos escritos de Karl Marx: "Proletários de todo o mundo uni-vos!". Através de uma análise da sociedade portuguesa, a par da situação dos outros povos da Europa, concluem que "os operários lutam no campo da legalidade, contra a iniquidade capitalista; mas não devem esquecer que a legalidade é filha da força e que só esta autoriza aquela" e que "a emancipação dos trabalhadores há-de ser obra dos mesmos trabalhadores". De entre as associações, pertencentes à União, que subscrevem o manifesto salientamos a Associação Fraternal dos Fabricantes de tecidos e Artes Correlativas, cujo signatário é Eudoxio Cezar Azedo Gneco. Desde então, as referências a esta data e às comemorações da mesma surgem na imprensa, embora sem grande aparato. Salientamos, no entanto, alguns artigos, publicados nos periódicos locais. Assim, no dia 1 de Maio de 1901, O Trabalho de Setúbal dedicou a primeira página à efeméride, com um artigo intitulado "O Primeiro de Maio", da autoria de Manoel Luiz de Figueiredo, sob o pseudónimo de Marius, no qual lamenta o afrouxamento das manifestações operárias neste dia, que perderam a "sua significação revolucionária". Os trabalhadores voltaram a manifestações puramente contemplativas da Natureza e esqueceram a componente revolucionária que esta data carrega porque "o capitalismo tem que cair, como todas as instituições que passaram, porque chegado ao seu apogeu se tornou incompatível com o progresso humano, porque só fabrica miseráveis - e os miseráveis são já tantos que andam a tecer-lhe a mortalha, feita de sangue e dores". Mas a situação manteve-se ao longo dos anos, pois os operários têm dificuldade em perceber a importância deste dia. Em 1904, o Germinal de Setúbal, em artigo de fundo, infere esta realidade ao recordar que esta data foi interpretada de diversas maneiras, adulterando-se-lhe o seu verdadeiro significado. "A ideia inicial do 1º de Maio não foi de festa, foi de luta [...] [mas] com um operariado assim instruído não é de estranhar que a data, 1º de Maio, tenha sido entre nós simples pretexto para um dia de folga, com peixe frito e as costumadas libações. Não abandona as oficinas; pede por favor ao patrão licença para se manifestar revolucionário [...]. Para nós continuará sendo o dia da Festa do Trabalho, até que os trabalhadores compreendam a desarmonia destes dois termos e se emancipem da odiosa tutela dos mentores sem o que jamais se libertarão do jugo aviltante do salário". Em 1905, Libânio R. Romão analisa a situação e considera que, em Portugal, o 1º de Maio apenas serviu para "nulos e vaidosos passearem as suas picarescas figuras em dia determinado [...] [com] quixotescos cortejos, em que os vivos vão aos cemitérios como que pedir aos mortos energia para as lutas reivindicadoras [...] porque o operariado português só é revolucionário no 1º de Maio, [...] corre-lhe nas veias capilé em lugar de sangue [...], reza, paga e dorme, indiferente aos mais rudimentares movimentos de emancipação humana [...]. Não se reivindica direitos quando se não sabe o que se quer, sob pena de simplesmente se mudar de senhor. E disso está a humanidade farta" . Em 1906, o Germinal inicia o seu artigo de fundo com um autêntico hino à natureza para comparar esta paz com a situação social que justifica a guerra entre os homens porque o 1º de Maio deveria ser para os trabalhadores "um dia de lutas e de luto - de luta contra a ordem social burguesa; de luto pelos camaradas imolados à tirania do Estado, legítimo representante do capitalismo". Aproveita para recordar "dois grandes homens do movimento operário internacional: Kroptkine [...] e José Fontana, o evangelizador do socialismo em Portugal [...]. Em 1907, toda a primeira página era dedicada ao 1º de Maio, num apelo à luta, "Pela Revolução Social! O Germinal recordando a data revolucionária do 1º de Maio incita os trabalhadores ao combate e evoca os humildes, os simples, as vítimas da exploração, mortas em holocausto pela burguesia. Ao mesmo tempo recorda os que morreram na luta sacrificando-se pela Ideia [...]".
Com a implantação da República a situação modifica-se e os trabalhadores alteram, relativamente, o seu modo de ver o dia 1º de Maio.

5 de Outubro 1910No semanário O Trabalho, no ano de 1911, Francisco de Noronha incita os proletários de Setúbal a irem para as ruas e, pacificamente, exteriorizarem a sua vontade indómita de vencer. Esta devia ser uma manifestação em massa, na qual o povo trabalhador, consciente, sincero e unido, mostrasse a união de classe para provar a força que possuía, pois, ao ver desfilar os operários, no dia 1 de Maio, firmes e decididos a levar até ao fim a luta pela justiça social, talvez a calma sarcástica dos exploradores começasse a desaparecer e fossem levados a pensar na força dos que viviam apenas do trabalho. Esta manifestação levaria o operariado a consciencializar-se da necessidade do "associativismo, do cooperativismo económico e da federação internacional" e mostraria aos detentores do capital a força dos trabalhadores, uma vez que apenas pela persistência se consegue vencer. Mas, ao que parece, as manifestações do 1º de Maio em Setúbal foram tristes e pouco participadas. No dia 6 de Maio, o Germinal diz-nos que este dia devia ser dedicado não apenas à explicitação das reivindicações dos trabalhadores, mas também um dia de revolta pelas injustiças que se cometiam no mundo do trabalho. Lamentava que esta data tivesse passado sem qualquer manifestação de vitalidade dos proletários desta cidade, que sempre souberam mostrar uma inteligente orientação de classe. Atribui, no entanto, esta atitude aos graves acontecimentos do dia 13 de Março que haviam culminado com a morte de dois trabalhadores, como já foi referido. O Trabalho, de 7 de Maio, limitava-se a relatar os factos sem comentários e a tecer louvores ao grupo da Sociedade União que percorreu as ruas, associando-se à festa do trabalho. A folga nas fábricas de conserva foi geral, como havia sido estabelecido pelos soldadores. Muitos trabalhadores doutras indústrias faltaram nas oficinas para marcar uma posição de solidariedade e apoio ao desejo de fazer, deste dia, o dia de festa de todos os que ao trabalho dedicam suas vidas. Lamentam mais uma vez, como já o haviam feito em 16 de Outubro de 1910, que o Governo, ao estabelecer os feriados nacionais, esquecesse o 1º de Maio, facto que consideravam sintomático.Ao ler O Trabalho, porta-voz do Partido Socialista, e o Germinal, porta-voz dos Anarco-sindicalistas, encontramos uma divergência profunda no modo como formalizam o apelo aos trabalhadores para que exprimam publicamente o seu sentir. Enquanto que o primeiro considera o 1º de Maio um dia de festa, o segundo concebe-o como um dia de revolta. Esta dicotomia de pensamento vai estar sempre presente ao longo dos anos e expressar-se-á através das atitudes tomadas pelas associações de classe lideradas por uns ou por outros, quando os conflitos laborais atingem situações de ruptura. A comemoração do 1º de Maio no ano de 1912 é anunciada em vários semanários como a Alvorada, A Folha de Setúbal e O Trabalho, que são unânimes em afirmar que este dia, festivo para os operários de todo o Mundo, foi celebrado em Setúbal com muito entusiasmo. Logo pela manhã houve uma salva de morteiros e muitos foguetes e três grupos musicais percorreram as ruas da cidade tocando o hino do 1º de Maio e a Internacional. Os grupos eram compostos por operários soldadores, metalúrgicos e carpinteiros navais. Na sede da Associação de Classe dos Soldadores realizou-se uma sessão solene comemorativa da data que marcou o início das reivindicações, aliás justas, dos operários. Usaram da palavra, além dos setubalenses, alguns convidados vindos de Lisboa. Os principais oradores foram Francisco Fernandes Costa, António Marques, José Bennedy e Lima Costa, tendo os deputados Manuel José da Silva, Augusto César dos Santos e Martins dos Santos pedido desculpa pela sua não presença. Embora mais modestamente, todas as associações de classe festejaram o dia, mesmo não sendo feriado.No dia 3 de Maio de 1913, o Elmano fala dos festejos do dia 1º de Maio que considerou excepcionais. Logo pela manhã, ouviu-se a tradicional salva de morteiros e a banda que percorreu as ruas tocando, como habitualmente. De tarde, o comércio fechou e "mais de metade da população" saiu para o campo, onde o convívio foi alegre e os "piqueniques" fartos; o dia coincidiu com as celebrações de Quinta-Feira de Ascensão, facto que a imprensa operária ignora.Em 1914 a imprensa anunciava os festejos habituais mas O Trabalho comunicava ainda que, neste dia, um novo semanário - A União Operária - iniciava a sua publicação e, nele, todos "os indivíduos sindicados" podiam escrever. Este facto vem na sequência das diligências que os directores de O Trabalho vinham fazendo para conseguir o desenvolvimento cultural das classes trabalhadoras. Assim, tentavam transformar o dia que lhes era dedicado numa jornada de sensibilização cultural e reivindicativa que, pelo facto de ser escrita, era mais profícua, chamava a atenção das entidades patronais e deixava o testemunho dos operários para as gerações vindouras. Angelina Vidal, em artigo de fundo, alerta os trabalhadores e lembra-lhes que o 1º de Maio não pode nem deve ser uma declaração de guerra mas "uma indicação serena, um aviso da Justiça Social, imponente, austera e invencível, mas humana e generosa".

Inauguração do túnel do QuebedoNo dia 1 de Maio de 1915, em O Trabalho, Marius escreve um belíssimo artigo de fundo, no qual refere a tristeza que a Guerra trouxe a este dia. Mas a Folha de Setúbal fala-nos das manifestações habituais, em anos anteriores, como fogo de artifício e músicas matinais, realçando o significado da sessão solene, realizada no Casino Setubalense, para inauguração do Centro Recreio e Propaganda Livre, durante a qual usaram da palavra oradores de destaque no meio associativo operário. À noite, realizou-se no mesmo local um espectáculo comemorativo do acto. Neste dia publicou-se o número um de O Semeador, boletim mensal do Centro Recreio e Propaganda Livre que, na página 7, nos fala do 1º de Maio como um hino de louvor à Natureza e ao povo trabalhador como seu mantenedor e o único que produz riqueza. No resto dos periódicos locais, embora encontremos alusões a estas manifestações verifica-se pouco entusiasmo nas mesmas, pois a Guerra absorvia as atenções e entristecia as pessoas. O apelo à luta e à união era ainda e sempre a tónica dominante nos discursos e nos escritos.O ano de 1916 foi ainda mais triste. Os periódicos que conseguimos ler, uma vez que muitos haviam suspendido a publicação, não fazem referência a quaisquer manifestações no dia 1 de Maio, como era hábito em anos anteriores. A Voz da Mocidade, cujos responsáveis estavam ligados ao Partido Republicano, publicou o seu número 30 exactamente neste mesmo dia e não faz qualquer referência à data enquanto que, no número seguinte, uma local apologética do 14 de Maio sai logo em primeira página. Em O Trabalho, porta-voz dos socialistas setubalenses, não se esquece a data que tão querida era aos seus dirigentes pois, no dia 30 de Abril, Manoel Luiz de Figueiredo, sob o pseudónimo de Caserio, em "Actualidades", lamentava a Guerra e afirmava que ela era o universo daquilo que o proletariado queria, quando em 1 de Maio de 1889 fez a grandiosa manifestação de solidariedade entre todo o povo trabalhador. "Os gritos de fraternidade universal que outrora saíam, nesta data, do peito dos trabalhadores, fê-los calar o estrondo dos canhões [...]", diz-nos claramente Manoel Luiz de Figueiredo. No número seguinte, ainda em "Actualidades", sob o pseudónimo de Casério, critica os preparativos para a comemoração do 14 de Maio, data que, segundo ele, nada representava para o povo português, pois não passou de uma luta entre republicanos, pela posse do poder. Entretanto, no dia 22, o República anunciava um alegre "piquenique" organizado pelo Centro Republicano Democrático para "festejar a data da 2ª revolução que derrubou a ditadura Pimentista". A festa, que apelida de "patriótica", foi abrilhantada por um grupo musical, havendo baile até anoitecer.Mais um ano passou sob o flagelo da Guerra. Em O Trabalho, César Nogueira faz um historial do que foi o 1º de Maio, interroga-se sobre o que ele será depois da Guerra e conclui: "Saudemos, pois, o advento da Paz para que possam, no dia 1º de Maio celebrar as conquistas da democracia socialista e o reconhecimento do direito à vida, síntese e aspiração suprema do Socialismo". O Setubalense, para além de lamentar os eventos que impediam de festejar com euforia a data mais querida dos trabalhadores, congratulava-se com o facto de, em Setúbal, este dia não passar despercebido, pois que as associações de classe dos Trabalhadores do Mar e da Construção Civil realizavam sessões solenes para as quais solicitavam a comparência de todo o operariado setubalense. A manifestação foi concorrida e teve a participação da Sociedade Musical Capricho que tocou os hinos "1º de Maio" e "Internacional".No ano de 1918, O Setubalense anunciava a grande festa do 1º de Maio que conteria música, "piquenique" e sessões solenes. A Associação dos Trabalhadores do Mar convidara, entre outras personalidades, Pinto Quartin que fez vibrar os operários setubalenses com o seu brilhante discurso. A banda da Sociedade Capricho tocou os já referidos hinos pelas ruas da cidade, enquanto que a Sociedade Musical União realizou um "piquenique" para os seus associados, na quinta da Azeda.Em 1919, o Eu Sei Tudo de Setúbal, anunciava a celebração, neste ano, "após a Guerra burguesa, quando a Revolução Social abalou, desde os fundamentos, a pútrida sociedade capitalista [...]", das comemorações habituais do 1º de Maio. No número seguinte, o redactor do Eu Sei Tudo considerava que este foi um dia de "verdadeira festa para o povo trabalhador setubalense [...] [que] desde muito cedo acordou com ar festivo. O cortejo que se organizou para ir esperar os delegados da UON e que mais tarde percorreu as ruas da cidade, indo visitar as sedes das classes operárias, foi deveras imponente. No cortejo incorporaram-se representantes de todas as associações de classe de Setúbal, acompanhados duma banda de música e de muito povo que constantemente dava palmas e vivas. Foi muito notada e censurada a não comparência das sociedades musicais setubalenses. O Comício que se realizou no Parque das Escolas foi muito concorrido, falando diversos operários das janelas da Associação dos Trabalhadores do Mar, que foram constantemente ovacionados".Em 1920, O Setubalense diz-nos, contristado, que neste ano nada se fizera, nem uma banda percorreu as ruas, como era habitual, embora, na sede da Associação dos Trabalhadores do Mar, se realizasse uma sessão solene. A última notícia sobre o 1º de Maio, antes do 28 de Maio de 1926, encontramo-la na primeira página da Voz Sindical, que se publicou naquele dia. Sob o título "1º de Maio de 1926", este "semanário sindicalista", em apenas nove linhas, recordava a componente ideológica adstrita a esta data, saudava o "proletariado universal, a imprensa revolucionária de todo o Mundo e todos os que, perseguidos pela sociedade capitalista, sofrem [...] as agruras do cárcere, fazendo votos para que as massas trabalhadoras, em breve, se conjuguem num esforço titânico, implantando sobre a Terra a verdadeira igualdade".Sob vivas à "Revolução redentora dos Povos" e à "Fraternidade Universal", surge uma gravura que mostra o quebrar das amarras da subjugação dos trabalhadores ao capital que os acorrentava a um labor desumano e frustrante para qualquer ser humano.Através da imprensa que analisámos, não apenas local mas também nacional, verificámos que o dia 1º de Maio manteve, a par das manifestações de reivindicação operária, dinamizada mais pelos políticos do que pelos trabalhadores, uma componente mística, na qual a Natureza e os mortos assumem lugar primordial. A própria luta dilui-se em "piqueniques", cortejos e música, embora haja o cuidado, da parte dos mentores do movimento, de introduzirem nos discursos e nas letras dos hinos "1º de Maio" e "Internacional" uma forte componente revolucionária. Concordamos com Fernando Catroga quando afirma que "de facto, o 1º de Maio deu origem a um acontecimento complexo, em que aparecem miscigenadas uma componente agónica, outra lúdica e ainda outra de inspiração tanatológica", uma vez que todos os escritos que pudemos analisar na imprensa operária nos mostram estes três elementos, sempre presentes nas manifestações do 1º de Maio, na cidade de Setúbal, sem esquecer outros modos de expressar os sentimentos dos dinamizadores das manifestações operárias que se baseavam, fundamentalmente, nos princípios conducentes à Revolução Cultural que todos os homens de esquerda defendiam para o povo português e, no espaço que tem sido alvo deste estudo, para os trabalhadores setubalenses. Ouçamos Carlos Fonseca, através do Voz Sindical, de Setúbal em:"A Igreja e a Escola":Donde vens tu, mulher, como a desgraça esquálida?Que precoce velhice em tua fronte alveja?Quem és tu? Donde vens, ó mísera, tão pálida?Eu sou a Ignorância, e venho duma igreja!E tu, bela mulher, rosada, alegre e pura?Que ostentas no semblante a seiva das corolas,Quem és tu? donde vens, punjante criatura?Eu sou a Educação, e venho das escolas" !Associações de beneficência e de utilidade públicaPerante a inexistência de assistência médica e social aos indigentes, nos finais do século XIX proliferaram, como já referimos, as associações de socorros mútuos que vieram complementar a actividade de benemerência exercida pelas Misericórdias, asilos e outras instituições de caridade, normalmente ligadas à Igreja Católica. Estas continuaram, no entanto, a sua acção caritativa, uma vez que poucos eram abrangidos pelas associações mutualistas, destinadas, fundamentalmente, a operários e a outras pessoas com relativa capacidade financeira. Os pobres não podiam pagar para pertencerem a associações de socorros mútuos. Assim, embora não exaustivamente, analisaremos o funcionamento das várias instituições de benemerência, por elas representarem um elemento de extrema importância na sociedade portuguesa dos finais do século XIX, princípios do século XX, com especial incidência na cidade de Setúbal, predominantemente operária.Em 1893, Almeida Carvalho (historiador local) exprimia o pensamento dos finais do século XIX, ao afirmar que "a moralidade de uma sociedade se mede menos pelas belas máximas registadas nos livros dos pensadores do que pelo grau de penetração no âmago dessa carne viva, a que se chama povo. Onde aparece um asilo, um albergue, um hospital, ou um qualquer abrigo de pobreza ou socorro do infortúnio aí se ergue um templo sagrado abençoado pelo Céu e onde se respiram os três mais raros e sublimes perfumes da Terra: a caridade, a abnegação e a felicidade [...]".Santa Casa da Misericórdia
A Santa Casa da Misericórdia que, depois da revolução que implantou a República Portuguesa, passou a denominar-se Associação de Beneficência da Misericórdia de Setúbal, nasceu na então vila de Setúbal no ano de 1499 a pedido dos seus moradores . Em 1657 adoptou os Estatutos, ou Compromisso, da sua congénere de Lisboa, que os mandara imprimir em 1616 e reformulara em 1618. Mas, em 1868 a Irmandade setubalense elaborou os seus próprios Estatutos. As alterações introduzidas, excluindo as referentes à forma e funcionalidade dos órgãos, são o prenúncio do desmantelamento da prática totalitária e centralizadora, tal como do racismo e da demarcação de classes, até então claramente instituídos. O novo documento retirava poderes aos órgãos centrais, remetendo-os para a assembleia geral de Irmãos. Em 1889 houve nova revisão, cuja alteração mais significativa foi a redução da interferência da hierarquia religiosa na vida da instituição e a simplificação do texto. Os Estatutos foram reeditados em 1905. Mas, em 20 de Dezembro de 1911 foi recebida uma comunicação da Administração do Concelho, na qual se fazia alusão a uma Portaria do Ministério da Justiça, datada de 18 do mesmo mês e que incumbia a Irmandade de reformar os seus Estatutos nos termos da lei da Segurança da Igreja e do Estado. Este tomou, então, conta da instituição e transformou-a em Associação de Beneficência da Misericórdia de Setúbal e nomeou, para a orientar, uma Comissão Administrativa que elaborou novos Estatutos, apresentados no dia 6 de Abril de 1912 e aprovados em assembleia geral no dia 27 do mesmo mês. O texto, já inserido no contexto ideológico vigente, introduzia algumas alterações de fundo. Como exemplo salientaremos o facto de os menores poderem ser admitidos como sócios, desde que autorizados pelos pais ou tutores, assim como as mulheres casadas, com autorização dos maridos. A primeira mulher que se fez sócia foi Maria Augusta Sousa Fialho, casada com António Mendes Fialho, Tesoureiro da instituição desde 1907. Mas a Associação de Beneficência da Misericórdia de Setúbal perdeu esta denominação para, depois de 30 de Junho de 1930, voltar a auto-intitular-se de Santa Casa da Misericórdia de Setúbal. Na sessão seguinte (25 de Julho para a primeira e 31 de Julho para a segunda) a respectiva acta referia já a nova denominação. Mas só seis anos depois, por alvará do Governo Civil do Distrito de Setúbal, datado de 26 de Março de 1936, o Governador Civil, Francisco Luiz Supico, confirmou a sua aprovação.Esta instituição, cuja função era praticar actos de assistência e beneficência, era constituída por: Hospital Civil, destinado ao tratamento gratuito dos indigentes do Concelho; Asilo Acácio Barradas para inválidos do sexo feminino; Asilo Bocage para inválidos do sexo masculino; e podia ainda orientar instituições de protecção e assistência às crianças ou ainda outros estabelecimentos de assistência que futuramente fossem necessários. Igreja e Estado estavam mais uma vez em sintonia ideológica. Além dos Estatutos, esta instituição de beneficência possuía um "Regulamento Interno" para o hospital da Santa Casa da Misericórdia de Setúbal, aprovado em 1853, a que se sucederam outros com alterações de ocasião. Conhecemos um modelo aprovado em 1929 e publicado em 1930.
Asilo da Infância DesvalidaNos finais do século XIX, a sociedade começa a debruçar-se sobre a evolução da criança e do jovem, iniciando-se a formulação de leis que dizem respeito aos grupos etários mais baixos, dando corpo ao "Direito de protecção a menores [...], constituído nos diversos países, em ramo autónomo através de sucessivos diplomas. Nas legislações latinas essa autonomia formou-se à custa do direito penal, nas legislações germânicas o ponto de partida foi o direito civil". À diferenciação no direito substantivo correspondeu a do direito adjectivo ou processual e a constituição de tribunais próprios . Em Portugal os acontecimentos desenrolaram-se de forma idêntica à dos outros países latinos. "No entanto, o nosso Código Civil, nos art. 284º e seguintes, referindo-se à tutela dos menores abandonados, previa a organização de um Conselho de Beneficência Pupilar, ao qual seriam entregues, depois dos sete anos, os menores abandonados para que lhe fosse dado o rumo de vida mais vantajoso, colocando-os em algum estabelecimento, ou entregando-os por contrato a pessoas que quisessem encarregar-se da sua educação e ensino". O projecto do Código Penal de 1861 referia-se já às casas de correcção de menores e o Código Penal de 1886 continha várias disposições sobre a responsabilidade criminal da criança e seu regime especial na aplicação de penas. "Num congresso jurídico que, por iniciativa do grupo português da União Internacional de Direito Penal, se reuniu em Abril de 1897 na Academia das Ciências de Lisboa, ventilou-se largamente o problema da delinquência infantil, sendo opinião estabelecida que esta devia ser subtraída ao âmbito do direito penal geral e ao dos tribunais comuns, para ser objecto de diplomas especiais e jurisdições também especiais". Portugal, como se pode verificar, foi um dos primeiros países a preocupar-se com a protecção jurídica e civil a menores, principalmente sob o aspecto de reeducação e correcção das crianças delinquentes. Os asilos foram, desde muito cedo, as instituições mais importantes para a prevenção do crime e de situações consideradas atentatórias da moral instituída. Assim, o sexo feminino era o alvo principal das atenções, principalmente as crianças órfãs ou abandonadas. Em Setúbal, o problema foi equacionado em meados dos anos sessenta e, de imediato, resolvido pela população da cidade que acorreu a prestar auxílio às jovens desprotegidas, participando na fundação do Asilo da Infância Desvalida. Este "[...] estabelecimento de caridade e instrução [foi inaugurado] no dia 28 de Junho de 1868" e ficou instalado no edifício adjunto à Igreja de Nossa Senhora da Saúde, pertencente ao extinto recolhimento da Senhora da Saúde, criado pelos Padres Jesuítas de S. Francisco Xavier em 1746, para abrigar jovens do sexo feminino da região. A cedência destas instalações foi feita pelo Governo, autorizado pelo rei D. Luiz em documento publicado no Diario de Lisboa, nº 151, de 10 de Julho de 1867. Não estava dependente da Santa Casa da Misericórdia nem "brotou do espírito faccioso dos partidos, mas do espírito popular [...]. Serviria [...] para instruir o povo de como ele pode criar instituições [...] e mostrar o verdadeiro interesse pela ilustração popular". Os dinamizadores deste projecto, de que se destaca Manuel Maria Portela, elaboraram os respectivos estatutos, concluídos no dia 1 de Janeiro de 1866 e aprovados pelo Governo, com algumas alterações, em 4 de Abril do mesmo ano. O regulamento que definia o funcionamento da instituição, desde a educação ao vestuário, aos horários e disciplina, aos castigos e ainda ao comportamento das asiladas e das criadas, foi composto por João Ignacio da Cruz Fortes e por João José Soares (secretário) e possui a data de 11 de Maio de 1866.No dia da inauguração (28 de Junho de 1868), o imóvel, devidamente ornamentado, esteve aberto ao público, que acorreu em grande número e teve oportunidade de observar as instalações destinadas a recolher as crianças, do sexo feminino, desprotegidas da cidade. Na Igreja houve missa cantada e sermão a cargo do padre Caetano de Moura Palha Salgado. A ideia de criar este asilo partiu do redactor do Jornal de Setubal (iniciou a sua publicação no dia 28 de Outubro de 1866), Manuel Maria Portela (também redactor de Voz do Progresso, em publicação desde 1864), que incitou, por largo tempo, os setubalenses a empenharem-se no projecto, através de artigos publicados nos periódicos que orientava. Assim, foram muitos os que contribuíram, com donativos e serviços, para que o empreendimento fosse um êxito. Salientamos os legados de Gertrudes Angelica de Andrade Ligeiro e do Comendador Francisco de Borja Freire, na aquisição do qual se empenhou o então presidente do Conselho Director do asilo, Dr. Antonio Rodrigues Manitto.No ano de 1876, a receita desta instituição de caridade fora de 1 803$603 réis, enquanto que a despesa orçou em apenas 1 574$401 réis, facto que alegrou a população da jovem cidade de Setúbal. Desde a sua abertura até ao final do ano de 1878 admitiu "40 alunas internas, muitas das quais, depois de educadas, e suficientemente instruídas para a modesta ocupação a que podem ser destinadas", foram colocadas como criadas em casas de famílias da cidade. Em 1880 esta instituição protegia 40 jovens, das quais 20 estavam internas e outras 20 externas, confiadas às Irmãs Hospitaleiras de Portugal. O Dr. Domingos Garcia Peres, Presidente do "Conselho Director" em 1880, conseguiu que o Barão de S. Miguel dos Campos, brasileiro, oferecesse a esta casa de beneficência uma avultada verba, destinada à construção de um edifício para instalação da escola primária da instituição. Mas, em 1884, o Subdiácono Antonio Candido de Figueiredo, da Academia Geral das Ciências, apelou para o Juízo de Direito da cidade de Setúbal, contra o Asilo da Infância Desvalida, exigindo "que se julgue fideicomissária a disposição fl. 8v. do testamento, em que D. Gertrudes Angelica d`Andrade Ligeiro deixou [...] a Marianna Angelica d`Andrade certos bens para usufrui-los enquanto viva e, morrendo, passarem, e seus rendimentos, para o referido asilo". O apelante alegava ser pai de duas filhas que tivera com Marianna Angelica d`Andrade, já falecida, julgando-se assim com poder paternal sobre elas para quem reclamava uma herança de sua mãe. A sentença foi-lhe, no entanto, desfavorável por ser considerado como pessoa ilegítima para propor a acção, pois, "sendo católico apostólico romano, e tendo, de mais a mais, a ordem sacra de Subdiácono, casou civilmente com aquela mulher; que tal casamento, católica, ou civilmente considerado, é nulo, inválido e não produz efeitos civis; assim que não era mulher do apelante essa tal, as filhas são ilegítimas e ele não tem sobre elas pátrio poder". Com a rejeição da apelação de Antonio Candido de Figueiredo, o asilo manteve a posse dos bens que lhe haviam sido doados por Gertrudes Angelica d`Andrade Ligeiro, uma das fontes mais importantes para a manutenção desta instituição de caridade. Em 1897, o Conselho Director deste asilo apresentou um relatório e contas respeitantes ao ano de 1896, no qual informava sobre a situação dos prédios e dos títulos de dívida pública, pertença desta casa, sobre os encargos pios, o pessoal ao serviço do asilo, os sócios subscritores, o capital mutuado, os legados, as asiladas e ainda sobre as receitas e despesas daquele ano. O Conselho Director, composto por Domingos Garcia Peres (presidente), Visconde de Mont`Alvo, José Maria da Rosa Albino, João José Ferreira da Silva Junior, José Guilherme d`Araújo (tesoureiro) e José Gonçalves da Cunha (secretário), comunicava, ainda, aos setubalenses que o Governo Central recusara a isenção de contribuição, ao abrigo do regulamento de 1 de Julho de 1895 (institutos de beneficência), facto que prejudicava imenso as asiladas, uma vez que a instituição já era onerada com o pagamento de côngrua paroquial. Assim, o número de admissões foi reduzido, pelo que naquele ano apenas entraram quatro asiladas internas e seis externas, das quais quatro contribuíam com 1$000 réis mensalmente. Enquanto as mais necessitadas usufruíam de uma refeição diária e de ensino, as outras apenas frequentavam a escola. Em 31 de Dezembro de 1896, o asilo albergava 51 raparigas, em regime de internato. Os donativos oferecidos eram em dinheiro, em géneros ou em serviços, e o Conselho Director agradecia, não apenas à população em geral mas, particularmente, à imprensa pela publicação gratuita de anúncios, a Sebastião Trindade pela cedência do seu estabelecimento de banhos para as asiladas e a Amado Lopes "pela sua coadjuvação obsequiosa em diversos expedientes".A despesa feita com as asiladas internas foi, no ano de 1896, de 55$501 réis, per capita.No primeiro Domingo de Março de 1906 reuniu a assembleia geral deste asilo para prestação de contas e para ser lido o relatório da gerência, relativo ao ano de 1905. Seguidamente foram eleitos os corpos gerentes para o ano em curso, não se verificando qualquer tipo de problemas. Em 1913, a celebração do 43º aniversário da inauguração desta instituição teve lugar na sua sede, no dia 12 de Junho, pelas 12 horas, e constou de sessão solene comemorativa do acontecimento, comédias, entreactos, monólogos e cançonetas, desempenhados pelas alunas do estabelecimento e ainda cânticos interpretados pelo grupo coral. Houve também distribuição de prémios "às alunas que mais se distinguiram durante o ano pelo seu comportamento, aplicação ao estudo, asseio e amor ao trabalho". Na sala estava patente ao público um bazar dos artefactos produzidos pelas alunas e, nos intervalos das dramatizações e sessões comemorativas os presentes tiveram ocasião de ouvir um sexteto constituído pelos professores João Symaria, Antonio Figueira Pereira, Maurício dos Santos Indias, José A. Lobo de Veiga, Diogo Carlos da Silva e Joaquim Correia que executaram os seguintes trechos musicais: Marcha Nupcial de Mendelsshon, Rapsódia Portuguesa de Figueiredo, Ária das Estrelas extraída da ópera Taunhauser (solo de violoncelo) de Wagner, Família Polaca (valsa) de Gilbert e Marcha Triunfal de Grieg. A comemoração integrou um jantar oferecido às alunas pelo Conselho Director do asilo . As festas de aniversário realizavam-se todos os anos pois os proventos obtidos revertiam para as despesas do asilo, assim como as verbas provenientes de outras festas organizadas por várias entidades da cidade, com esta intenção. Citamos, como exemplo, a récita, realizada no Casino Setubalense no dia 24 de Dezembro de 1918. O jantar oferecido às crianças desta casa, pelas suas madrinhas, na Quinta de Ramos Reynaud, ao Rio da Figueira, abrilhantado pelos músicos da Sociedade Capricho Setubalense e com um passeio de galera emprestada, para o efeito, pela firma Mariano Lopes. A Associação dos Trabalhadores do Mar, à semelhança do que sempre fizera, colaborou na festa, neste caso, emprestando os bancos e mesas necessários ao empreendimento.A actividade desta instituição permaneceu durante a ditadura salazarista, uma vez que a mentalidade que presidiu à fundação destas casas de caridade se manteve incólume mesmo durante a vigência dos governos da Primeira República. Tal facto pode inferir-se de um pequeno texto produzido por um tal Dr. Simplorio, que mais não é do que o pseudónimo de Alberto Fialho (director de A Mocidade desde 22 de Maio de 1918), talvez nos ano de 1913, aquando da festa acima referida, ou em 1919 (pois fala das febres más que mataram a mãe de uma asilada e, segundo os documentos existentes, se fizeram sentir em 1918), para ser representado neste asilo. Ao longo das 10 pequenas páginas, as crianças, usando linguagem de adulto, embora simples, transmitem sentimentos deformados, impróprios da sua idade, mas bastante comuns na sociedade em que viviam. A educação feminina ministrada às asiladas, na qual a "boneca" é o centro e o símbolo da submissão, salienta o papel que a sociedade reservou à mulher e ainda a miséria, a solidão e o abandono que envolvem as infelizes orfãs, acolhidas no asilo por caridade cristã, sentimentos bem claros na voz de Julieta quando afirma: "[...] É tão triste a gente não ter ninguém que nos estime!...". Dando corpo à organização social definida pelo capitalismo, as crianças, ali internadas, organizam-se de acordo com os apoios que cada uma tem fora da instituição. Assim, a Julieta, porque tem uma boneca oferecida pela madrinha, é tratada por "menina", enquanto que as que nada possuem se tratam apenas pelo nome próprio, se submetem a tudo e a todos, aceitando a sua posição e agradecendo reconhecidamente as esmolas que os ricos ou até mesmo os menos pobres se dignam conceder-lhes: Fernanda ajoelha-se aos pés de Julieta e, beijando-lhe os vestidos, agradece-lhe a boneca com as seguintes palavras "obrigada, obrigada meu anjinho!...". o asilo é, ao longo do texto, o pólo principal, o único que libertava as infelizes crianças do mundo adverso em que se encontravam: "[...] E foi assim querida amiga que, trazendo-me para o asilo, me fizeram a esmola de me tirarem daquela atmosfera de miséria e podridão [...]". Sistema económico, regime político, hierarquização social, educação e cultura interpenetravam-se de tal modo que formavam uma teia incorruptível, a mentalidade dominante que tudo fazia para permanecer incólume. A caridade e a estratificação social continuavam substituindo as tão ambicionadas solidariedade e igualdade. Orfanato MunicipalEsta instituição, que mais tarde tomou o nome do Dr. Sidónio Pais, era destinada ao internato de rapazes órfãos de pai e mãe, falecidos "por ocasião da epidemia pneumónica, [...]" e foi fundada em 1918 pela Câmara Municipal de Setúbal, sob a presidência de Henrique Augusto Pereira. Ficou instalada no antigo edifício do Recolhimento da Soledade, cedido à Câmara pelo Governo Central. Este estabelecimento de caridade estava a cargo da Câmara Municipal e preparava os rapazes para a vida prática. Ao atingirem os 18 anos, os internados eram colocados "em lugares e trabalhos compatíveis com o ensino que receberam". Nos dias 28 a 30 de Agosto de 1927 realizaram-se as festas deste orfanato na Avenida Luiza Todi, compostas de arraial, quermesse e música tocada pela banda desta instituição, como aliás se fazia anualmente, facto que comprova a sua permanência durante o regime saído do 28 de Maio de 1926.Associação de caridadeFundada em 1885, esta associação de senhoras da cidade de Setúbal tinha como objectivo o "exercício da caridade cristã, [concentrando] a sua actividade sobretudo em assistir não a quaisquer pobres mas àqueles que, retidos no leito da dor pela enfermidade, privados dos meios para o tratamento conveniente, pereceriam naturalmente faltos de toda a consolação corporal e bem martirizados pela tristeza e angústia do espírito, se pessoa amiga e benfazeja não fosse levar ali os meios que faltavam, ao mesmo tempo que com palavras salutares levava o conforto ao coração". Desde a sua fundação até Maio de 1896 (11 anos), as "visitadoras" desta instituição deram assistência a 4 232 doentes, embora tivessem "visitado" 6 421 necessitados.O trabalho da associação desenrolava-se do seguinte modo: As "sócias activas" ou "visitadoras" deslocavam-se a casa dos pacientes e informavam-se sobre as suas reais necessidades para evitar hipotéticas fraudes. Seguidamente, feito o levantamento daquilo que cada doente carecia, eram-lhe enviados os alimentos em vales de carne, pão, açúcar, arroz ou leite, durante o período da doença e da convalescença. Ao longo do período estudado (11 anos), a Associação de Caridade distribuiu 22 961 vales de carne no valor de 1 564$845 réis, 14 266 vales de pão num total de 269$725 réis, vales de arroz que prefizeram 154$210 réis e vales de açúcar que custaram 350$640 réis. Distribuiu ainda 154$210 réis em dinheiro. Além desta assistência, considerada imediata, esta instituição fornecia roupas e, à semelhança do que se passava nos hospitais, emprestava camas sempre que necessário e providenciava as visitas médicas aos doentes, pois todos os clínicos de Setúbal o faziam gratuitamente, especialmente os Drs. Calheiro e Francisco Soveral, desde o início sempre dispostos a acorrer às solicitações que lhe eram feitas . Os medicamentos receitados eram também fornecidos pela associação que até 1892 foi ajudada pela Misericórdia, mas de 1892 a 1896 suportou sozinha este encargo, aliás bastante pesado pois orçava em cerca de 70$000 réis mensais. Assim, em Abril de 1896, o Provedor da Santa Casa da Misericórdia decidiu permitir que as receitas destes doentes fossem "aviadas gratuitamente na farmácia do hospital". A actividade desta instituição foi bastante profícua pois que, tendo sido a média anual de doentes visitados quase de 385, a média dos falecidos foi de apenas 15 que, quando nada mais havia a fazer para lhe salvar o corpo, eram confortados com todos os sacramentos e ajuda espiritual que a Igreja Católica podia fornecer, chegando alguns até a casar catolicamente, tendo para tal toda a ajuda da associação, de particulares e dos párocos da cidade. As responsáveis pela Associação de Caridade eram: Thereza Paes de Sande e Castro Cabedo como presidente, Maria Guilhermina da Silva C. Simal como 1ª secretária, Zelinda Guilhermina M. Cypriano como 2ª secretária e Anna C. Arhens Corrêa como tesoureira geral. Todas as senhoras que constituíam a direcção eram visitadoras, à excepção da presidente, cujo nome figurava apenas na lista das tesoureiras e protectoras. Esta instituição era parte integrante do processo mental vigente à semelhança de todas as instituições de caridade e assistência, como já foi referido, e, como se pode verificar pelos nomes das suas responsáveis, orientada por elementos do sexo feminino, oriundos das melhores famílias do aglomerado urbano de Setúbal.


Associação de Beneficência EscolarÀ semelhança do Asilo da Infância Desvalida, que recolhia as crianças e jovens do sexo feminino, esta associação recolhia as crianças e os jovens do sexo masculino até aos 16 anos. Algumas das suas actividades foram referidas na imprensa local e destas salientamos a do dia 1 de Janeiro de 1915, quando ofereceu aos seus protegidos um jantar que constou de: "canja de galinha, carne guisada, galinha corada com batatas, vinho tinto, frutas verdes e secas, queijo, doces diversos e vinho do Porto". O jantar foi servido por Palmira Portela e filha Maria José Pinto Guimarães Nascimento, Emília Rosa do Carmo Ribeiro, Carminha Xavier Motrena Mendes e Violeta Motrena Mendes. No final do repasto, o presidente da direcção Manuel José Salgueiro apresentou aos jovens o professor Eduardo Diniz Ribeiro e, seguidamente, Manuel Maria Portela Junior fez uma pequena alocução às crianças, incitando-as a que seguissem sempre pelo caminho do bem, "respeitando tudo e todos". As aulas teriam início pelas 9h do dia seguinte. A seu favor se realizou no Campo dos Arcos um festival desportivo, em Outubro de 1927.A maioria das associações de beneficência e caridade estavam, como pudemos verificar, dependentes da Santa Casa da Misericórdia, embora houvesse algumas fundadas por iniciativa particular e mesmo oficial ou religiosa. É o caso, além das já referidas, da Associação Setubalense da Caridade que foi fundada pelo Dr. Fernando Garcia Peres, da Confraria de S. Vicente de Paula, das cantinas escolares existentes nas freguesias de S. Julião e Anunciada e da Associação Católica dos Escuteiros de Setúbal. Manteve-se a caridade cristã sem que nunca se percebesse a tentativa de integração dos jovens abrangidos (rapazes ou raparigas) na sociedade setubalense, facilitando-lhes estudos além do ensino primário e da especialização para trabalhos servis. A mentalidade que dominou durante a Monarquia manteve-se, ao longo da Primeira República e Estado Novo, que aproveitaram as instituições de beneficência apoiando a educação aí ministrada, de tal modo que chegaram aos nossos dias.Associação de utilidade pública: Bombeiros VoluntáriosSob o lema "vida por vida", se fundou em Setúbal, em Março de 1883, a Associação dos Bombeiros Voluntários. Para a consecução do projecto, reuniram-se, no dia 19 de Outubro, o grupo dinamizador composto por: Arthur Mena e Henrique Augusto Pereira, entre outros, para decidir da fundação desta associação. Durante o encontro, o vereador Joaquim José Corrêa declarou a disponibilidade da autarquia para auxiliar a concretização dos planos traçados, oferecendo também a máquina de extinção de fogos que possuía. Arthur Mena pôs os seus conhecimentos como bombeiro à disposição do grupo para ser seu instrutor. No dia 22 do mesmo mês reuniu, pela primeira vez, na sala do Clube Dramático, a assembleia geral desta associação, presidida pela Comissão Instaladora para definir os princípios segundo os quais se iria orientar. Arthur Mena propôs a existência de duas categoria de sócios: activos e protectores, situação com que todos concordaram. Foi ainda eleita a Comissão incumbida da elaboração dos estatutos que ficou constituída por Arthur Mena, Henrique Augusto Pereira e José Manoel Corrêa. Henrique Augusto Pereira pôs à disposição da associação a bomba para extinção de incêndios que possuía, pelo que os presentes aprovaram um louvor pela sua atitude. Quanto a Arthur Mena que, sem ser setubalense, assim oferecia os seus préstimos, foi-lhe atribuído o diploma de sócio honorário, embora ele declarasse inscrever-se como sócio protector. Finalmente, foram eleitos os primeiros corpos gerentes e o comando da associação. Os estatutos foram aprovados em sessão de 6 de Dezembro, tendo sido levantada a hipótese de organização de uma "charanga" da associação.No dia 9 de Março de 1884, pelas 12 horas, na sala das sessões da Câmara Municipal de Setúbal, procedeu-se à inauguração da Associação dos Bombeiros Voluntários, na presença dos sócios. No dia 6, em reunião da assembleia geral, foi apresentado o relatório da direcção cessante e eleitos os novos corpos gerentes. A nova direcção realizou sorteios para angariação de fundos.No dia 7 de Abril de 1887, O Districto anuncia a eleição dos corpos gerentes da associação, ficando como presidente da assembleia geral José António Januário da Silva e como presidente da direcção Joaquim José de Sant'Anna. De acordo com o espírito que anima este tipo de associações, os Bombeiros Voluntários de Setúbal realizaram, no seu clube, uma soirée em benefício das famílias dos pescadores que, no dia 18 de Abril de 1887, morreram junto ao porto, vítimas de acidente. A imprensa anuncia o evento, elogia a iniciativa e apela à população para que participe activamente. O apelo é renovado no dia 24 de Abril, referindo que o produto da festa iria "matar a fome a nove famílias, algumas com cinco e seis crianças que ficaram orfãs na horrível catástrofe que lhes assassinou os pais, e lhes tirou o pão e o carinho [...]". No dia 10 de Março de 1907 passou a intitular-se Real Associação dos Bombeiros Voluntários de Setúbal; em 1915 retomou a denominação de Associação dos Bombeiros Voluntários de Setúbal e teve a receita, proveniente de donativos oferecidos pelas companhias de seguros, alguns particulares, venda de vários objectos e prémios ganhos em incêndios, de escudos 211$26, e a despesa, por compra de material novo, arranjos e conservação do material antigo, de escudos 277$65, resultando portanto um saldo negativo de escudos 66$39".Para celebrar o seu 32º aniversário, o corpo de Bombeiros Voluntários de Setúbal realizou um exercício geral no Domingo, dia 7 de Março de 1915, pelas 17 horas no prédio de Manuel Salgueiro, na Praça de Bocage . Mas, em Novembro de 1916, em consequência de um desentendimento entre esta associação e a Câmara Municipal, a direcção decidiu reorganizar o seu serviço de incêndio, de modo a causar menos despesa ao cofre municipal. No dia 12 de Janeiro de 1919 esta associação, que havia feito previamente convite aos sócios através da imprensa local para comparecerem no seu quartel, não conseguiu realizar a eleição de novos corpos gerentes e apresentar o seu relatório de Contas respeitante ao ano anterior, por falta de quorum. A eleição teve lugar no dia 18, embora a do Presidente se realizasse posteriormente, no dia 27 do mesmo mês. No Domingo, 9 de Janeiro de 1927, a Associação dos Bombeiros Voluntários de Setúbal convidou, através da imprensa local, "os seus consórcios" a assistir à experiência de uma moto-bomba recentemente adquirida. O evento teve lugar no dia 10, Segunda-Feira, pelas 15 horas, na Praça de Bocage, seguido da inauguração de um "carro pronto-socorro". Esta última cerimónia constou de "uma pequena festa na estação da Praça Francisco Ferrer, com inauguração e baptismo do carro". No dia 14 de Fevereiro, pelas 20 horas, o Corpo de Bombeiros foi solicitado para socorrer o Parchal (iate impulsionado por motores a óleos pesados), barco que se encontrava no porto, prestes a afundar-se. Este salvamento, embora fosse a primeira experiência deste tipo, foi um êxito, facto que levou o Instituto de Socorros a Náufragos a conceder à Associação dos Bombeiros Voluntários de Setúbal um diploma de louvor, "primeira recompensa oficial que a associação recebeu". No dia 9 de Março deste mesmo ano, "realizou-se [...] no quartel dos B. V., a comemoração do 44º aniversário da fundação da associação. No dia 18 de Agosto 1928 celebrou-se o "Dia do Bombeiro", realizando-se em Setúbal uma reunião de todos os chefes de secção e ainda uma pequena formatura para mostrar a importância destes homens que dedicam os seus tempos de lazer ao salvamento de vidas humanas . Em 26 de Janeiro de 1929, pode ler-se em todos os periódicos locais a notícia de que foi adquirida uma auto-maca para serviço dos Bombeiros Voluntários. Finalmente, em 1933, a Associação dos Bombeiros Voluntários de Setúbal celebrou os 50 anos da sua fundação. Os festejos culminaram com a publicação de um número único, comemorativo do acontecimento, no qual se encontra parte da história desta humanitária instituição. O seu cabeçalho, à semelhança de todo o conteúdo documental e ideográfico, mostra-nos claramente o sentimento de todos os setubalenses perante esta obra tão grandiosa "Ao passo que há muitos sistemas doutrinários, partidos, seitas e dogmas, para o bombeiro só há uma política e uma religião: A Humanidade"..
Associações de Cultura e Recreio
"Mas não é só dentro do meio operário que o princípio associativo da população setubalense se manifesta e verifica em muitos dos seus aspectos. No que respeita ao meio artístico, cultural e desportivo e ainda o que é caracterizado abertamente como benificante e humanitário, todas essas modalidades têm larga representação no conjunto do princípio associativo"."Entre 1880 e 1900 abre-se para a cidade sadina um período musical de certa intensidade. O gosto e o prestígio da música infiltrou-se em todas as camadas sociais". Nasceram então em Setúbal vários grupos denominados de Sol-e-dós e de Guitarradas, que mostravam a sensibilidade musical de todos os setubalenses, independentemente do estrato social a que pertenciam pois que, "no seio das famílias humildes discutem-se com calor os méritos artísticos de muitos executantes militares e civis".Em Dezembro de 1911 fundou-se em Setúbal a Associação de Propaganda Educativa. Em Outubro de 1914 foram constituídos na cidade os grupos denominados Juventude Libertária e Recreio e Propaganda Livre. No dia 11 de Julho de 1927, o Distrito de Setúbal anunciava a criação de uma nova Sociedade de Recreio na cidade de Setúbal, cujos Estatutos haviam sido entregues no Governo Civil para aprovação. Inserida no contexto pós-28 de Maio, aparece na cidade sadina uma nova instituição a que se chamou Sociedade Promotora de Educação Popular, situada no Bairro Lopes, que, no dia 17 de Julho de 1927, Domingo, realizou "uma sessão solene comemorativa do 1º aniversário da sua fundação" e, em Agosto deste mesmo ano, fez eleger os corpos gerentes para o exercício do mandato para 1927/1928, em Setembro abriu "as inscrições para as frequências das escolas nocturnas, para sócios e filhos de sócios desta mesma associação". Em finais de Junho de 1928 a sua sede foi visitada pelo Governador Civil do Distrito de Setúbal, pois esta instituição possuía "uma das melhores escolas particulares" da cidade. Em 1929 encontrava-se numa situação bastante precária que a imprensa local referia ao anunciar o início dos bailes carnavalescos acompanhados de "bazar modelo" para obtenção de verbas tão necessárias para a manutenção da escola.


Actividades desportivas À semelhança do que se passava em todo o país, o desporto na cidade de Setúbal, durante o lapso de tempo que nos propusemos analisar, passou por três fases com características muito próprias. Durante a primeira, desde 1880 a 1910, o desporto tinha como objectivo principal a ocupação de tempos livres, sem qualquer linha de orientação ou método desportivo. Numa segunda fase, desde 1910 a 1920, o desporto atravessou um período de transição, durante o qual se começou a esboçar uma estruturação da prática desportiva, conjuntamente com o incremento do associativismo que, à semelhança do que se passava a outros níveis, se radicou fortemente no campo desportivo. Finalmente, no período entre 1920 e 1930, verificou-se a formalização e a institucionalização do desporto, surgindo os clubes, as colectividades e ainda uma grande diversidade de modalidades desportivas que começaram a fomentar a competição, dando nova forma ao desporto. Encontrámos 42 clubes desportivos registados em Setúbal, que disputavam vários jogos entre si e também com grupos de outras cidades do país, principalmente de Lisboa.
"O gosto pelos desportos é velho em Setúbal, pois já em 14 de Outubro de 1880 se fundou nesta cidade a Associação Fluvial Setubalense. O seu distintivo era uma corneta branca sobre fundo azul e as suas primeiras reuniões realizaram-se nas salas da Academia Filarmónica Setubalense. A sua fundação veio anunciada nos nºs 594 da Gazeta Setubalense, 148 e 149 da Gazeta do Sado. O Clube Naval Setubalense foi fundado no dia 6 de Maio de 1920 e visava a prática dos desportos náuticos, na cidade de Setúbal. A primeira direcção era constituída por nomes conhecidos na sociedade setubalense, como o Dr. Carlos Botelho Moniz, o Tenente Silva Escudeiro, o Capitão Cassar, João Manuel Teixeira e Virgílio Santana.Associações de cultura e recreio.Sociedade Filarmónica Capricho SetubalenseFundada em 22 de Novembro de 1867, a Sociedade Filarmónica Capricho Setubalense foi reformada em 5 de Outubro de 1875. Nasceu por iniciativa de alguns elementos de dois grupos filarmónicos conhecidos por "Amarelos" e "Vermelhos". O primeiro, fundado pelo velho Cassar, com a colaboração de Antonio Avelino, um dos organizadores do Antigo Círio da Arrábida, devia o seu nome ao facto dos seus associados "serem da parte do Rei". Os segundos denominaram-se "Vermelhos" porque os seus fundadores pertenciam ao grupo anarquista local e foi fundado por António Trombão (deformação de trombone, instrumento que tocava no grupo) e José Manoel Rosa, entre outros. Ambas ensaiavam numa sala do Palácio dos Cabedos, no Largo de Palhais. Extintas estas duas filarmónicas iniciais, em virtude das rivalidades artísticas e políticas, "surgiram das suas cinzas, ainda fumegantes, a Filarmónica Marcial Firmeza com sede na Rua Direita de Troino (seria extinta anos depois) e a Sociedade Filarmónica Capricho Setubalense". A Capricho instalou-se na Rua dos Correeiros. A sua primeira actuação foi no dia 22 de Novembro de 1867, durante os festejos do dia de Santa Cecília, padroeira da música, cuja imagem ficou na posse desta colectividade. A filarmónica teve como regentes, entre outros, José Luciano de Carvalho, José Cipriano e o espanhol José Garcia. A 22 de Agosto de 1869 a Capricho tocou na festa do Senhor do Bonfim, em 1871 tocou na inauguração da estátua a Bocage e em 1875 surge uma reestruturação do grupo, por iniciativa de Heliodoro Pacheco, presidente da sociedade. Então, Domingos Caldeira e Manoel Maria Portela escreveram, respectivamente, a música e a letra do Hino da Capricho. Em 1881 a fachada da sede desta associação apareceu com um transparente iluminado, no qual se lia o seguinte poema, referente à situação que então se vivia em Portugal: ."Já provámos a dor e amargura,da violenta feroz opressão,e rompemos o grilhão funesto,da humilhante fatal união.A vitória das eras antigas,soleniza o país dos vencedores.Fiel amigo de nações amigas,mas indómito jugo dos opressores".
.Em 1884 a Sociedade Capricho tocou no arraial da festa a Nossa Senhora do Cais e, conjuntamente com a Sociedade Firmeza, tocava no Passeio da Praia (hoje Avenida Luiza Todi). Luciano Neto Casal, regente na filarmónica desde 1884, elevou a fanfarra à categoria de banda em 1894, quando a sociedade já se instalara no edifício do teatro Bocage, situado na Rua Nova da Conceição (hoje Avenida 5 de Outubro). Daqui mudou-se para a Rua das Esteiras (hoje Rua Estevam de Vasconcelos) e, finalmente, para a sua sede actual, no edifício onde estava instalada a Santa Casa da Misericórdia (onde ocupou o segundo andar), no largo com o mesmo nome onde, em 1899, foi inaugurado o palco. Nele foram representadas as seguintes peças: "Martírios e rosas", "Tudo em bolandas" e "Homem de calças amarelas". Na passagem do ano de 1899 para 1900 a Sociedade Capricho promoveu, no Largo da Misericórdia, uma festa "para despedida do século e saudação ao século das luzes". Neste mesmo ano, a imprensa noticiava várias festas de que destacamos a realizada nos dias 21 e 22 de Janeiro, durante a qual se exibiu o grupo dramático e Agripino Maia, executando desenhos instantâneos que muito agradavam aos espectadores. Seguiram-se bailes de máscaras, récitas, representações, sem esquecer a música no Passeio da Avenida, nas comemorações, nas festas profanas e, com reportórios especiais, nas festas religiosas: "Esta simpática sociedade, que acompanha a procissão do Enterro, está ensaiando duas lindas marchas fúnebres".Em 1902 realizou-se a inauguração dos melhoramentos efectuados na sede para propiciar um melhor funcionamento aos grupo cénico e banda e, em 21 de Janeiro de 1903, a sociedade promoveu uma festa para angariação de fundos que serviriam de suporte às despesas provenientes da mudança de uniformes, exigida pelo Ministério da Guerra, pois os que possuíam eram passíveis de serem confundidos com o fardamento militar. Decidiram então criar um fato absolutamente inconfundível: "sapato branco (para evitar a engraxadeira), meia preta (para destacar), calção azul e colete dourado (ouro sobre azul), casaco verde, gravata roxa (cor sugestiva) e barrete encarnado [...] delineado por uma comissão composta [...] por Agripino Maia, Illydio Pestana e Manoel Ventura [...]". Neste mesmo ano formou-se, dentro desta associação, "a Trupe Musical O caixeiro". No dia 16 de Outubro de 1904 foi inaugurado o estandarte, confeccionado por Paulina Azeda, de acordo com o desenho do pintor setubalense Francisco Augusto Flamengo e com uma lira da autoria do artista João Carlos da Silva. Era trabalhado em "seda e bordado a ouro, em alto relevo". A caridade foi, normalmente, um dos objectivos desta sociedade, como provam várias notícias de que salientamos a publicada no dia 17 de Julho de 1904 e que diz: "No teatrinho da Sociedade Capricho realiza-se no Sábado, 23 de Julho, um benefício que reverte a favor de Anna Margarida da Graça, uma pobre viúva rodeada de filhos e sem nenhum recurso de vida [...]". Em 1905 ainda se realizavam espectáculos para auxiliar aquela família, conforme noticia a imprensa local: "[...] realiza-se hoje no teatrinho desta sociedade, um espectáculo cujo produto reverte em favor de uma pobre viúva [...]". Também em 1907 se podem ler anúncios de festas de caridade; como exemplo citamos: "Em benefício da senhora Paulina da Conceição sobe hoje à cena, no teatrinho daquela sociedade o drama em três actos Segredo do pescador e o entreacto dramático Os dois operários [...]". Os bailes campestres foram normalmente realizados, durante o verão, em "lindo recinto convenientemente preparado [...]". As actividades mantiveram-se, embora num ritmo mais calmo, facto que conduziu à quase extinção da sua banda, que foi salva pelo "Zé espanhol", quando se aproximava o 50º aniversário da associação. No entanto, as festas de aniversário da associação, entre outras, nunca deixaram de se realizar com pompa; como exemplo referimos as comemorações do 45º aniversário da sua fundação, festejado com soirée e quermesse nos Sábado e Domingo, sendo franca a entrada. Em 1913 as festas ocuparam mais tempo e desenvolveram-se em vários espaços; os festejos desenrolaram-se nos dias 8, 9, 10, 16, 23 e 30, nas salas da sociedade e nas ruas da cidade, verificando-se actividades variadas desde quermesse, alvorada, concertos, teatro, saraus dançantes e muitas mais. No ano de 1917 estrearam-se os dramas "Erro judicial" e "Veterana da liberdade" e ainda a comédia "Sexta-Feira 13". Em 1918, apesar da saída de rapazes setubalenses para a Guerra, António Júlio reorganiza a banda, atraindo os músicos que haviam abandonado o grupo, por falta de incentivo e promovendo espectáculos que fazem com que este volte a afirmar-se no meio cultural setubalense. A banda fortificou e, na década seguinte, Agripino Maia, que nasceu em 1882 e frequentou a aula de desenho na Escola Industrial de Setúbal, onde completou o curso com a classificação de distinto e pertenceu aos corpos gerentes desta sociedade, fundou o "grupo de Saxofones da Capricho" .Nesta instituição foi director de orquestra José Joaquim Cabecinha, músico de grande fama no país e mesmo no estrangeiro, que também exerceu estas funções no Grande Salão Recreio do Povo e no Casino Setubalense."O grande segredo da Sociedade Capricho Setubalense esteve sempre em saber escolher o reportório conforme as circunstâncias. Este é o grande segredo, este é o grande êxito. Música adequada, música à propós, música de todos os caracteres, política amorfa, religiosa, revolucionária, futurista, sindicalista e conservadora. Foi assim, por este processo, que a sociedade conseguiu penetrar no coração do povo. A história da Sociedade Capricho não é mais do que a repetição constante dos mesmos factos, dos mesmos episódios, do mesmo flirt artístico, do mesmo aplonb espiritual e do mesmo elan amoroso". "Acresce que ser sócio da Capricho é estar ao abrigo de todos os achaques. É digerir bem, é estar sempre bem disposto. Nunca, que me conste, um sócio da Capricho morreu de morte voluntária [...]". "Há famílias inteiras em Setúbal que devem à Sociedade Capricho a sua razão de existir [...] é que muitos indivíduos dessas famílias tiveram ali a sua génese psicológica".Em 1921 era presidente da direcção Francisco Augusto dos Santos, cargo que no ano seguinte, até Abril, era ocupado por José Augusto da Silva e, seguidamente, por António Francisco Amorim que, em 1923, promoveu obras de recuperação do espaço que a sociedade ocupava. Em 1924 era Artur Maia que presidia à direcção e fazia publicar o primeiro número do jornal A Capricho mas, no ano seguinte, António Francisco Amorim voltava à presidência. Em 1926 era eleito presidente Celestino Brito dos Santos que apoiou a publicação do terceiro e último número do jornal A Capricho. Em 1927 presidia José Vieira dos Santos mas, em 1928, António Francisco Amorim voltava a ser eleito presidente da direcção desta associação e permaneceu no cargo até finais de 1930. Então, Jorge Martinho Caló exerceu a presidência e idealizou novo estandarte para substituir o que existia desde 1904. Este bandeira foi inaugurada no dia 4 de Maio de 1930 e teve como madrinha Hortense Vieira. Na cerimónia estiveram presentes Martins dos Santos e Nogueira de Brito, jornalistas da capital, e as bandas das sociedades Filarmónica Palmelense e Musical União Setubalense. Foi distribuído um bodo a 100 famílias pobres. O estandarte, que ainda hoje vigora, possui duas faces em seda, uma azul escuro com um bordado circular ao centro no qual se destaca o busto de uma figura feminina, ostentando uma lira sob o braço esquerdo, por detrás da figura que supomos representar Santa Cecília, saem bordados a fio de ouro e lantejoulas. A outra face, de seda branca, mostra-nos uma coroa de louros ao centro, bordada em tons de verde com vidrilhos de cor grená. O estandarte foi oferecido por João Carlos da Silva, José Vieira e Manuel Francisco da Silva, acto que mereceu uma lápide de agradecimento ainda hoje existente numa parede da sociedade.Ao longo dos anos de sua existência, esta associação realizou bailes, espectáculos diversos e as chamadas "soirées familiares", sempre abrilhantadas por grupos musicais de Setúbal, dos arredores ou mesmo de Lisboa. Estas diversões realizavam-se, normalmente, nos fins-de-semana e em épocas festivas, durante as quais não havia momentos pré-determinados para a sua efectivação, pois surgiam sempre que havia condições propícias. Como exemplo citamos os bailes tradicionais dos santos populares que, no ano de 1921, vêm referidos na imprensa do seguinte modo: "Com uma vistosa ornamentação campesina e à veneziana na sua ampla e arejada sala, realizam-se nesta colectividade, nas noites de véspera e dias de Santo António, S. João e S. Pedro, bailes tradicionais dedicados aos sócios e suas famílias". Recordamos também o baile realizado no dia 16 de Junho de 1927, Quinta-Feira, classificado como "soirée familiar abrilhantada pelo grupo musical Os Invencíveis". E, no dia 19, Domingo, teve lugar "uma soirée dançante, [...] abrilhantada pelo distinto pianista Guedes de Almeida". As iniciativas culturais sucedem-se continuamente, não apenas por iniciativa da direcção mas também dinamizadas por grupos de sócios. Assim, no dia 7 de Julho de 1927, Quinta-Feira, "organizada por uma comissão de sócios desta sociedade", realizou-se "um sarau musical e dançante abrilhantado pelo grupo musical resistente Capricho S. Domingos, sexteto de saxofones, Capricho Setubalense e piano pelo distinto pianista [...] Carlos Guedes de Almeida". E, com a chegada do Verão, para encerrar a época de bailes (que recomeçaria em Outubro), no dia 16 de Julho de 1927, Sábado, realizou-se na sua sede "um interessante sarau musical e dançante" que atraiu grande número de sócios. No Domingo seguinte, esta sociedade organizou um pic-nic e festival na Quinta da Boa Vista, à Fonte da Talha, no qual participaram imensos sócios acompanhados de suas famílias. A banda desta sociedade que realizava vários concertos musicais no coreto municipal (este grupo executava, além da música de compositores setubalenses e de outros músicos nacionais, obras clássicas de que salientaremos a "Tosca" tocada em Setembro de 1927), situado na Avenida Luiza Todi, nas ruas da cidade e ainda nos arredores da mesma, deslocava-se a vários pontos do país onde actuava em festas. Como exemplo salientaremos a notícia que a imprensa local divulgou no dia 23 de Agosto de 1927, informando que este grupo musical se deslocaria a Estremoz para "abrilhantar as deslumbrantes festas que naquela cidade se [realizaram]" .No dia 26 de Outubro de 1927, teve lugar a celebração do 60º aniversário desta associação com "espectáculo de cine-concerto e variedades" no Salão Recreio do Povo, considerado pela imprensa local como homenagem àquela prestimosa instituição. Esta associação preocupava-se também com as crianças, pelo que realizava na noite de Natal "saraus dançantes", como podemos verificar através da imprensa local. As excursões foram também alvo da atenção desta prestimosa associação, especialmente quando tinham compromissos da actuação. Era o caso do passeio que anualmente organizava ao Vimeiro como a imprensa local refere: "No próximo Domingo, 23 do corrente, a Sociedade Capricho realiza a sua costumada excursão à pitoresca vila do Vimeiro onde a sua banda musical abrilhantará os festejos que ali se realizam". De salientar ainda a sua participação em festas de caridade organizadas fora da cidade de Setúbal, como por exemplo as realizadas em Évora, a favor da creche, lactário e Asilo da Infância Desvalida daquela cidade, no dia 15 de Julho de 1928, viagem que aproveitou para abrilhantar a corrida de touros ali realizada e para dar um concerto no jardim público de Évora. Os princípios básicos que presidiram à fundação desta associação estão bem claros na letra do seu hino escrito, como já foi referido, em 1875 por Manoel Maria Portela e de que salientamos as quadras mais significativas:"Nossos ócios da vida d`obreiroà harmonia ceder nos apraz,do progresso seguindo o luzeiro,nestas lidas de estudo e de paz.Protestámos amor pela arte,e esse voto jamais se quebrou;prosseguimos com nosso estandarte:o Capricho, não, não se acabou...Em convívio fraterno enlaçadasnossas almas deixemos unir,na amizade e nos sons enlevadas,o sincero prazer a fruir"..Sociedade Musical e Recreativa União SetubalenseA Sociedade Musical e Recreativa União Setubalense, que foi fundada em 22 de Março de 1899, existira já sob a denominação de Firmeza Operária, instalada na Rua das Amoreiras. Nasceu do grupo Os Amarelos, já referido aquando da fundação da Sociedade Capricho, que formaram a Banda de Música Firmeza; por dissidência de alguns dos elementos deste agrupamento, formou-se a Sociedade Filarmónica Operária que deu origem à Sociedade União. Teve a sua sede no Teatro D. Amélia (posteriormente Luiza Todi), donde mudou para a casa onde hoje se encontram (por demolição do teatro, já depois de 1930, então pertença da CUF), situada na Avenida Luiza Todi. A sua filarmónica tornou-se célebre em Setúbal e no resto do país. Na imprensa local podemos ler várias notícias sobre deslocações deste grupo a outras cidades e vilas para abrilhantar as suas festas. Como exemplo citamos uma notícia publicada na imprensa local, em 15 de Setembro de 1915: "Deixou agradável impressão em Estremoz a magnífica filarmónica União Setubalense que, sob a regência proficiente do nosso amigo Snr. Ariovisto José Valério, foi abrilhantar as grandes festas [...] realizadas naquela formosa vila alentejana".Em 11 de Setembro de 1919 regressou de Alvito onde foi actuar e, em Outubro, dinamizou a realização de um espectáculo com a "Companhia Dramática Juvenil de Setúbal, sob a direcção de [...] Manuel José Envia. Constava de representações das comédias Médico-mania, Tuborda no Pombal e um acto de variedades que agradaram em pleno".No dia 30 de Abril de 1921 a Sociedade União iniciou os festejos comemorativos do 22º aniversário "da reforma desta sociedade". As actividades prolongaram-se até 16 de Maio, "em dias alternados". No primeiro dia, Sábado, houve alvorada festiva pelas 6 horas, sessão solene (com abertura da quermesse) pelas 22 horas e, seguidamente, soirée . No Sábado, 11 de Junho de 1927 iniciaram-se nesta sociedade as festas dedicadas aos Santos Populares (Santo António, S. João e S. Pedro) que as várias direcções sempre realizaram com esmero, proporcionando aos sócios e seus familiares espectaculares momentos de diversão. A sua banda, tal como acontecia com a banda da Sociedade Capricho, exibia-se na cidade, arredores e no exterior, como provam várias notícias publicadas na imprensa local. Como exemplo: "De volta de Vila Real de Santo António, chegou hoje a Setúbal a [banda da] Sociedade União". Também as crianças eram alvo de divertimentos elaborados exclusivamente para elas. É o caso da "soirée dançante" dedicada às crianças na noite de Natal. As comemorações do 1º de Dezembro não foram esquecidas pela direcção desta sociedade recreativa pois dinamizou neste dia um "sarau dançante", no ano de 1928. A sua actuação em actividades caritativas era bastante conhecida. A atestá-lo temos a atribuição de diploma de Sócia Honorária da Corporação dos B. V. dos Caminhos de Ferro de Sul e Sueste do Barreiro, entregue em sessão solene no Domingo, 13 de Maio de 1928, na sede desta sociedade. Em Janeiro de 1929 informa os sócios, através da imprensa local, de que só poderão entrar na sede da colectividade se apresentarem o respectivo cartão acompanhado da quota do último mês . As festas comemorativas do seu 30º aniversário foram anunciadas na imprensa local e realizaram-se no segundo fim de semana do mês de Maio de 1929. Durante as comemorações procedeu-se à homenagem de saudade aos artistas setubalenses, Ana Gomes Bateiras e Francisco Augusto Flamengo, que trabalharam no estandarte da referida Sociedade que, neste ano fora substituído por outro, mas que ficou guardado "como relíquia". Ana Bateiras começou a bordar o estandarte em 29 de Junho de 1899, que fora mandado executar por uma comissão composta por José Agostinho Paulo, José Joaquim Rosa, José Estevam Farinha, José da Rosa e Antonio Coelho. "O estandarte é bordado a matiz e pedras finas, tendo dum lado o emblema da Sociedade e do outro as armas da cidade, sob desenhos do hábil pintor setubalense, Francisco Augusto Flamengo, sendo a sua entrega feita solenemente e com grandes festividades a 22 de Novembro do mesmo ano, dia de Santa Cecília". O novo estandarte foi oferecido por um grupo de senhoras e, no dia 15 de Outubro de 1928, fora solenemente inaugurado e a sua sagração teve lugar na Igreja Paroquial de S. Julião, seguindo-se uma "sessão solene no Grande Salão Recreio do Povo, onde foi feita a imposição das fitas de diversas sociedades congéneres e de recreio, tanto de Setúbal como de outras terras do distrito".Clube Setubalense
Foi fundado em 1855, embora desde 1854 se houvessem iniciado reuniões "para a criação de uma agremiação de recreio (sendo esta a mais antiga), inspirada nos clubes ingleses da época. Integravam estas reuniões as mais ilustres famílias de Setúbal" . Desde a sua fundação, esta sociedade não teve hino nem estandarte nem banda, possuiu apenas uma bandeira azul com as siglas do clube em dourado.A Agremiação de Recreio foi constituída num dos salões dos Paços do Duque (hoje edifício do Governo Civil), no dia 12 de Novembro de 1855, com o nome de Associação do Club Setubalense. Foram seus sócios fundadores: João Ignacio da Cruz Forte, João Maria de Lima, João da Costa Novaes, Moreira de Brito, Manoel José Vieira Novaes, Paiva e Silva, Marques de Sousa, José de Nascimento e Oliveira, Dr. Antonio Rodrigues Manitto, Francisco Maria Cabral D`Aquino Mascarenhas, Joaquim Viana, José de Groot Pombo, João Carlos de Almeida Carvalho, Antonio José Pacheco e Antonio Pereira da Silva Perdigão. No dia 18 de Novembro de 1855, foi eleita a Mesa Provisória, constituída por João Ignacio Cruz Forte, João Maria de Lima e José do Nascimento e Oliveira. A direcção, também interina, ficou composta por Dr. Antonio Rodrigues Manitto e Francisco C. Mascarenhas. No dia 9 de Julho de 1856, foram aprovados, por carta régia, os Estatutos da associação, que haviam sido enviados ao Ministério dos Negócios do Reino. A "sede Social do Clube" foi inaugurada no dia 5 de Fevereiro de 1858, no edifício dos Paços do Duque, constando a cerimónia de sessão solene e soirée . No dia 19 de Outubro de 1884, a Gazeta Setubalense anunciava o terminus das soirées dançantes da quadra festiva daquele ano e em 15 de Fevereiro de 1885 o mesmo semanário noticiava que nesse mesmo dia e na Terça-Feira seguinte se realizavam reuniões de famílias na sede do clube. Esta associação, formada por elementos da alta e média burguesia setubalense, não aceitava sócios que não pertencessem à "mais fina sociedade setubalense", facto que, muitas vezes, tornava as festas pouco divertidas: "No Clube Setubalense, mercê de determinação da direcção que proibia a entrada a mascarados que não fossem compostos de sócios, poucas máscaras apareceram. A concorrência de damas e cavalheiros foi, no entanto, grande e selecta, reinando nas três noites o maior entusiasmo. [...] A matinée de Segunda-Feira foi realmente interessante. as crianças dançaram alegremente [...]. Apareceram deliciosos travestis, alguns verdadeiramente artísticos e luxuosos [...]". Era clara a intencionalidade de manter a selecção social, sem receio de o declarar publicamente, uma vez que as próprias notícias o referem: "No Clube Setubalense andam em ensaios algumas peças teatrais para um espectáculo, que deve ter lugar proximamente no elegante palco daquele clube e em que tomam parte várias damas e cavalheiros da 1ª sociedade setubalense. [...] haverá também concerto musical em que tomarão parte algumas gentis damas [...]"; "Nas elegantes salas desta agremiação deve realizar-se hoje um atraente sarau musical, para o que se reuniram todos os elementos de valor [...]".Em Fevereiro de 1890 reuniu a direcção efectiva deste clube, para preparar a revisão dos estatutos, tendo sido nomeada, para o efeito, uma comissão composta por Dr. Antonio Rodrigues Manitto e José de Groot Pombo, entre outros. No dia 11 de Fevereiro de 1898 esta associação passou a denominar-se Club Setubalense, por proposta da direcção, então composta por Antonio Pedro Cardoso Junior, como presidente; Antonio Teixeira como 1º secretário e José Pombo Ahrens, como 2º secretário.No início do século XX o clube realizava bailes campestres na Rua Almeida Garrett, ao Bonfim, num quintal cedido para o efeito, aos quais podiam acorrer "pessoas de diversas condições sociais", facto que os tornava mais animados. Realizavam ainda "saraus de época balnear", sempre muito concorridos. Nas festas nocturnas era, normalmente, exigido fato de cerimónia, embora, por vezes, quando se tratava de soirées familiares, pudesse ser escolhida "toillete [...] de passeio".Em 1920, José Gomes da Costa Russell de Amaral Sá Brandão, sócio e grande entusiasta do Clube, mandou construir um edifício na Avenida Luiza Todi, no primeiro andar do qual ficou instalada esta associação. Em 1925 o senhoria mandou fazer obras, sendo esta instituição obrigada a mudar, provisoriamente, para a sede da Liga de Propaganda e Defesa do Setúbal, onde funcionou até ao dia 30 de Janeiro de 1926, data em que regressou à sua sede na Avenida Luiza Todi, nº 99, enriquecida e com um salão nobre mais amplo. No dia 31 houve inauguração, com sessão solene e baile, "assistido pelas mais importantes famílias e personalidades da cidade de Setúbal". No dia 26 de Janeiro de 1921, faz saber que os bailes que esta colectividade costuma realizar na quadra carnavalesca se efectuariam na sede da Associação Comercial e Industrial, mantendo-se o produto dos mesmos "para o mesmo fim". Em 1927 foram aprovados os novos estatutos do Club Setubalense. A assembleia geral que sancionou o documento teve lugar no dia 13 de Março de 1928 e foi presidida por Domingos Fernandes Junior e secretariada por José Augusto de Almeida. Era, então, Vice-Presidente Antonio Alberto Bressame Leite Perry de Sousa Gomes.O "clube da elite" era o eleito das mais importantes famílias tradicionais da vila, depois cidade, de Setúbal, principais frequentadores desta associação, uma vez que os forasteiros muito raramente apareciam pois só podiam frequentar as suas actividades quando convidados por sócios, que eram escolhidos pelo sistema de "bola preta e bola branca" e, quando seleccionados pagavam uma jóia de 2$00 e quotas mensais de 4$00.As principais actividades do Club Setubalense foram:1- Bailes1. 1- Bailes de Máscaras: para crianças e para adultos;1. 2- Bailes Campestres: na Rua Almeida Garrett;1. 3- Bailes Domingueiros;1. 4- Bailes dos Dias Santos;1. 5- Bailes da Primavera;1. 6- Bailes de Verão.2- Festas2. 1- Festa da Flor, no Bairro Baptista;2. 2- Festa de Fim de Ano;2. 3- Festa de Natal, com distribuição de prendas às crianças;2. 4- Festas de Beneficência, como, por exemplo, para os asilos.Obs. As festas podiam ser organizadas pela direcção ou mesmo pelos sócios.3- Soirées3. 1- Soirées dançantes (valsas, mazurcas, ...);3. 2- Soirées familiares;4- Concertos clássicos5- Quermesses6- Palestras sobre Setúbal e outras7- Passeios8- Saraus, principalmente na época balnear9- Concertos por filarmónicas10- Exposições11- Leitura de jornais estrangeiros, especialmente franceses e ingleses (nos anos 1920). Durante a Guerra de 1914-18 liam-se revistas estrangeiras "para estarem a par do que se passava lá fora"."O Club Setubalense veio dar implemento à sociedade da época, principalmente a nível cultural, não sendo um simples clube para pessoas bem da vida, como muitas pessoas afirmavam ser", conclui Amílcar Albino, sócio desta instituição de cultura e recreio, amante da história da cidade de Setúbal e, como é óbvio, do seu clube.

Ateneu SetubalenseAntigo Grémio Literário e Artístico Setubalense, foi fundado em 1915. No dia 24 de Outubro de 1924, ainda com esta denominação, fez aprovar os novos Estatutos em assembleia geral, que foram confirmados pelo Governador Civil do Distrito no dia 30 do mesmo mês. O documento era composto por onze capítulos (Denominação e fins, Organização e classificação de sócios, Admissão de sócios, Deveres dos sócios, Direitos dos sócios, Penalidades, assembleia geral, Direcção, Conselho Fiscal, Biblioteca e Disposições gerais) que integravam 53 artigos.Este grémio, com sede em Setúbal, era uma associação de recreio e instrução, cujos objectivos consistiam em proporcionar aos seus associados e famílias todos os divertimentos e meios instrutivos capazes de dignificar a instituição e os seus sócios e promover o seu "aperfeiçoamento moral [...] difundindo a instrução e o ensino de conhecimentos úteis, abstraindo [...] os assuntos de carácter político ou religioso". Os sócios podiam ser contribuintes, de mérito e honorários, conforme os contributos para o desenvolvimento da associação. Os integrados nas duas últimas categorias ficavam isentos do pagamento de jóia e quotas mas não podiam ser eleitos para os corpos gerentes. Faziam parte dos direitos dos sócios contribuintes (doze), entre outros, a possibilidade de apresentarem na sede, qualquer visitante, mesmo que estrangeiro, utilizar os jogos e organizar comissões para promover festivais na sede ou outras dependências do grémio. O capítulo X, que se refere à Biblioteca, determinava que esta associação manteria uma biblioteca privativa para uso exclusivo dos seus associados, que apenas os poderiam consultar no gabinete de leitura existente na sede. Sempre que as festas se organizavam em benefício desta instituição, os sócios eram obrigados a pagar o bilhete de ingresso, como constava dos regulamentos interno e de festivais. Na mesma reunião da assembleia geral (24 de Outubro de 1924), foram eleitos os corpos gerentes do grémio. A Mesa da A.G. ficou composta por: Ernesto Leão da Cunha Duarte, como Presidente e respectivos secretários.De acordo com os seus objectivos, iniciaram as actividades e, ainda em 1924, informavam da realização, no Domingo seguinte, de "uma soirée masquée, com várias surpresas", à qual se seguiram outras iniciativas de que salientamos os bailes e soirées na época carnavalesca.

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Academia Sinfónica de SetúbalNascida em Dezembro de 1914, este grupo cultural promoveu, em Fevereiro de 1915, festas carnavalescas e apresentou a peça "O conserveiro". Em Abril a sua orquestra sinfónica realizou concertos regidos por Michel S. Lambertini, enquanto que a companhia de teatro continuava os seus espectáculos exibindo as mais variadas peças teatrais e se cantava ópera ("Rigoletho", "Palhaços" e "Traviata"), tudo no Teatro Avenida ou Luiza Todi. Em 6 de Outubro de 1915, sob o título "Academia Sinfónica de Setúbal", podemos ler a seguinte notícia: "Esta simpática colectividade já se acha instalada na sua nova sede, antigo teatro D. Amélia e nela já introduziu sensíveis melhoramentos. Sendo uma agremiação destinada a desenvolver a arte, é digna de todos os louvores a sua lembrança, dando àquela casa de espectáculos o nome da nossa ilustre cantora Luiza Todi, como preito de homenagem a essa fulgurante estrela da arte musical". "Pensa-se na organização de vários saraus dedicados exclusivamente aos sócios, devendo realizar-se brevemente o primeiro promovido por um grupo de sócios, em festa de homenagem ao ilustre maestro Lambertini, seu director artístico, aos incansáveis membros da direcção e ao organizador e ensaiador do grupo dramático e brilhante amador Severino Prompto, festa, reservada apenas aos sócios e seus familiares, em que serão inaugurados os retratos dos homenageados. Brevemente daremos o programa definitivo deste sarau que se realizará em matinée num dos próximos Domingos". A festa, comemorativa do primeiro aniversário do grupo, realizou-se na primeira Quinta-Feira de Dezembro, tendo sido o teatro ornamentado artisticamente, com conchas e flores, pelo cenógrafo Rogério Machado, que também elaborou o cenário para a festa. O sarau teve início com a conferência de Martins dos Santos, intitulada "A função social da arte", no decorrer da qual fez o elogio dos homenageados e falou sobre a função pedagógica e cultural desta associação a que desejou um longo e brilhante futuro, com o apoio dos setubalenses. Em Fevereiro foi inaugurada, na sua sede, uma exposição de quadros pintados por Alfredo Miguéis, professor da Escola Gil Vicente, que marcou "na vida de Setúbal uma nota intelectual assaz interessante". Este grupo realizou também quatro récitas de carnaval, com engraçadas comédias. Entretanto, começaram os ensaios para o novo concerto sob a direcção do maestro Lambertini, em que se fizeram ouvir obras de Mendelssohn, Haendel, Bizet, Beethoven, Schubert, Wagner e Gries, entre outros compositores célebres. Também o grupo coral se encontrava em actividade, tal como o grupo dramático. O primeiro cantava "o célebre coro dos Peregrinos", enquanto que o segundo representava a peça D. Cezar de Bazan.

Clube Tiro-Tauro"Este grupo deveras simpáticoFoi fundado com gosto e calor,Pode ser que lhe chamem lunáticoMas tem vida, tem força e vigor...Todo paz, a amizade por normaToma e quer por dever e por lei,Guerreando a rotina por forma,Que a rotina não entre na grei...Nossas forças, rapazes, juntemosPara tudo meter num chinelo...É preciso mostrar que sabemosO que é bom, o que é fino, o que é belo!Culto à Arte prestamos gostosos,Culto às letras, à honra, ao saber,Não esquecendo, digamos vaidosos,As mulheres, a beleza, o prazer...Se um descuido, porém, praticamosN`uma ceia fazendo saúdes,Não impede que nós não sejamosMinas, poços de excelsas virtudes...[...]".No dia 12 de Janeiro de 1903, Augusto Matos Alves convocou uma reunião para decidir sobre a formação do clube que, no dia 15, promoveu a eleição da primeira direcção constituída por: José Maria da Rosa Albino, como presidente; Manuel Severino Pronto, como secretário e Augusto Matos Alves, como tesoureiro. A sede desta associação era na Rua Álvaro Luz, 24, 1º. Ao longo do seu primeiro ano de vida dinamizou as seguintes actividades: no dia 7 de Fevereiro - primeiro banquete, de aniversário natalício do sócio Antonio Augusto Quintans; a 15 do mesmo mês realizou-se a primeira récita do clube no Teatro D. Amélia (depois Luiza Todi), com a representação da peça "Duque de Vizela". No dia 22, para apresentação do nome do clube, este organizou o seu primeiro cortejo carnavalesco e, no dia 8 de Março, fez a inauguração solene da sua sede. No dia 7 de Julho promoveu uma corrida de touros em benefício das Antigas Festas da Arrábida e no dia 6 de Setembro dinamizou nova corrida, agora a favor da Santa Casa da Misericórdia de Setúbal. No dia 5 de Novembro realizaram a festa artística das Irmãs Paternas, dedicada a este clube, no dia 22 deste mesmo mês organizou uma récita no teatro D. Amélia, em benefício da Sociedade União Setubalense e, no dia 24 de Dezembro, para comemoração do Natal, realizou um "sarau dramático e musical e árvore de Natal, com brindes às crianças, divertimento gratuito, no D. Amélia". Nos anos seguintes, até 1913, a associação continuou a realizar actividades afins, sem esquecer as festas de aniversário do clube, mantendo os objectivos fundamentais deste: "organizar passeios, caçadas, cortejos, teatros, touradas, regatas, serenatas, etc., etc., mas tudo à custa do clube e nunca do sócio [...]". O carnaval de 1906 foi muito animado. O Club Tiro-Tauro organizou um cortejo esplendoroso, com a rainha do carnaval, cujo palácio era o objectivo a atingir. O cortejo integrava carros alegóricos, pela seguinte ordem: "Três tipos característicos do Entrudo - chéchés - montando soberbas mulas; Banda de infantaria sem capricho; Regimento 111 de infantaria do chincharrinho com todo o seu estado maior; Carro da China puxado a duas parelhas, onde irá D. Zaragata [...]; Carro da Espanha [...]; Os excêntricos musicais Rossini; Balão dirigível [...]; Carro do Progresso - de caranguejo [...]; Carro das Damas de ouros, paus, [...]; Carro do Club, puxado a três parelhas [...]". O cortejo percorreu toda a cidade, desde o caminho-de-ferro à Avenida Luiza Todi, passando por 31 ruas e largos mais importantes.No dia 8 de Março de 1907, o Club Tiro-Tauro inaugurou a sua nova sede, num primeiro andar do número 10 da Praça da Ribeira, onde o célebre pintor setubalense, já referido, Francisco Augusto Flamengo, pintou um pano para o tecto. As quotas mensais eram de 2$500 e a jóia de 10$000 réis.As festas de caridade também faziam parte dos seus objectivos. Como exemplo citamos a récita que promoveram no dia 11 de Fevereiro de 1909, cujo produto reverteu a favor dos pobres do Douro, tendo rendido 118$850 réis, "quantia que foi entregue à direcção do jornal O Século". Ainda em 1909, este clube promoveu, em Setembro, uma pescaria, uma excursão ao Portinho da Arrábida e uma soirée. Em Outubro teve lugar a caçada anual. A caçada só se realizou no dia 7 de Novembro, na qual estiveram representados os clubes de Setúbal, Quinta do Anjo, Palmela, Azeitão, Lisboa, Évora e Elvas. Houve duas fases de caçada (manhã e tarde, pescaria, almoço na propriedade das Praias, regresso em automóveis, carruagens, bicicletas, jantar e serão cultural. Caçadas, tiro, pescarias e festas, especialmente de aniversário, continuaram a serem realizadas até 1912.Este clube deixou de existir no dia 31 de Dezembro de 1913, para renascer, "devido ao amor dos seus antigos sócios", em 17 de Fevereiro de 1923 (a inauguração teve lugar no dia 23 de Maio), esperando a sua direcção, "confiada no valor de seus consórcios, continuar mantendo as boas e nobres tradições do Tiro-Tauro-Dramo-Velo-Náutico-Musical-Excêntrico-Setubalense".

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Associações escolaresEm Setúbal, muitas outras associações se fundaram e se extinguiram, facto que nos mostra o interesse da população da cidade e de seus arredores pelas diversas expressões culturais, desportistas, de solidariedade, de protecção pública. Das que, ocasionalmente, eram citadas pela imprensa salientamos a Associação Setubalense de Instrução que, no dia 29 de Fevereiro de 1904 reuniu, em segunda convocação, a assembleia geral, para prestação de contas do ano de 1903" e, no dia 8 de Maio de 1904, abriu as matrículas para alunos de ambos os sexos, que só fecharam quando foi atingido o total de 50 inscritos. A Associação dos Alunos da Escola Industrial e Comercial Gil Vicente, fundada para defesa dos jovens que frequentavam esta escola, tinha também como função a dinamização de actividades culturais e educativas. Assim, a sua Comissão Administrativa realizou, no dia 17 de Março de 1927, na sala da Associação Comercial e Industrial uma festa de confraternização entre todos os seus associados, outros alunos e seus familiares e, no dia 24 de Agosto deste mesmo ano participava aos alunos e associados o falecimento de Renato Magalhães. Ligada também à educação, salientamos a Associação dos alunos do liceu que instituíram, em 1910, a Caixa Escolar do Liceu Nacional de Bocage, conseguindo, neste mesmo ano, ver publicados os seus Estatutos. Neles estavam contidos os seguintes temas: "denominação, organização geral e fins", "direitos e deveres dos sócios", "fundos", "direcção", "excursões", "socorro mútuo", "eleições" e "disposições finais". No dia 16 de Novembro de 1919, foram aprovados novos Estatutos pela assembleia geral, confirmados pelo Conselho Escolar no dia 3 de Dezembro e pela Direcção Geral do Ensino Secundário em 21 de Janeiro de 1920. Neste documento define-se a denominação, os fins, a organização geral, os sócios, seus direitos e deveres, os pensionistas (condições de concurso, deveres e direitos), a organização de excursões, a prática de desportos, a gestão dos fundos, composição da direcção e eleição dos corpos gerentes. Composta por professores e estudantes, tem como principal objectivo promover a educação dos seus associados através de excursões escolares e visitas de estudo, assistência escolar e desporto. Os sócios dividem-se em efectivos (professores da escola e pessoas que frequentem o estabelecimento de ensino em causa) e pensionistas (alunos que sejam socorridos pela Caixa Escolar de Socorros a Estudantes Pobres). Os alunos, que eram beneficiados pela Caixa Escolar extinta a partir daquele momento, continuaram a ser subsidiados pela nova Caixa até ao final do curso, desde que obtivessem a média de 11 valores tanto no exame (2ª e 5ª classes) como nas classes de passagem (1ª, 3ª e 4ª). Para uma melhor gestão dos fundos existentes, a Caixa Escolar possuía reservas financeiras com objectivos específicos: "Uma caixa de excursões, uma caixa de socorros a estudantes pobres e uma caixa de desportos", absolutamente independentes.

Papel da Associação na sociedadeEmbora a génese das associações populares de cultura, desporto e recreio se reporte ao século XVIII, apenas a partir de 1820 se desenvolveram, com as características com que hoje se nos apresentam. A situação difícil em que viviam as populações levaram-nas a juntarem-se para lutarem contra o analfabetismo, contra os salários insuficientes e pela melhoria dos transportes, da habitação, de condições de trabalho, enfim, por uma vida normal e feliz. Tais factos levam-nos a concluir que o aparecimento das associações, desde as puramente laborais, às de cultura, desporto e recreio, às mutualistas e de cariz caritativo ou de utilidade pública, se deveu, fundamentalmente, a fenómenos marcadamente sociais e políticos que provocavam a minimização dos trabalhadores dos vários ramos da economia nacional e, neste caso concreto, regional. Setúbal foi, desde muito cedo, um núcleo onde o associativismo se implantou nas mais diversas modalidades, como nos revelam os documentos de que dispomos. A estas instituições se deveu o despertar para a música, para o teatro amador. A alfabetização e o convívio eram alguns dos objectivos daqueles que se associavam, arranjavam a sede e elaboravam os seus Estatutos para que as actividades que realizavam fossem legalizadas. Com a proliferação das ideias socialistas e republicanas as associações serviam, além de beneficiar os consórcios, seus familiares e a comunidade envolvente, de local propício ao esclarecimento político. Com a República, nascida em 5 de Outubro de 1910, desenvolveram-se as colectividades e outras formas de associação. Centenas de células colectivistas apareceram e produziram grande trabalho social e cultural. A actividade que imprimiram aos seus trabalhos levou a que, em 1924, as colectividades de Lisboa, necessitando de um interlocutor idóneo junto das entidades oficiais, fundassem a Federação Distrital das Sociedades Populares de Educação e Recreio, que se transformou na Federação das Sociedades de Educação e Recreio e acabou por dar vida à Federação Portuguesa das Colectividades de Cultura e Recreio, quando o 28 de Maio de 1926 se aproximava.No que se refere a Setúbal, perante a dinâmica associativa com que aqui nos deparamos desde meados do século XIX até 1930, concluiremos da importância do meio associativo da cidade, nas várias modalidades e feições, especialmente as aquáticas, pela aproximação do rio e até do mar e ainda pelo futebol que se manteve activo e bem localizado nos campeonatos nacionais até aos nossos dias, através do Vitória Futebol Clube. Este, conjuntamente com o Clube Naval, mantiveram outros desportos, classes de iniciados e de ginásticas para ambos os sexos e várias níveis etários..
O "Cooperativismo" no aglomerado urbano de SetúbalFalar de cooperativismo em Setúbal, à semelhança do que se passava em todo o país, seria ousado e impreciso, tendo em conta a renovação socioeconómica que ele implicava e jamais se verificou. O cooperativismo "como uma fórmula de vida, uma estrutura social; como um sistema, uma solução, um ideal, um alvo [...], o prólogo indispensável, a condição necessária, para a prática quotidiana do amor do próximo, para o advento de uma democracia [...]; um regime baseado numa radical igualdade [...]", jamais se verificou no território nacional, embora em Setúbal as cooperativas e sociedades tivessem abundado, especialmente nas pescas, no consumo, na construção, e empresas subsidiárias das conservas de peixe e da própria pesca.Cooperativas de pesca
A tentativa de introdução do cooperativismo na cidade de Setúbal foi bastante forte, uma vez que a pesca, pela insegurança que provocava entre os que a ela se dedicavam, não era muito propícia a explorações individuais. As sociedade e mesmo as cooperativas de pesca proliferaram desde a segunda metade do século XIX. Das sociedades de pesca registadas em Setúbal salientamos a Sociedade de Pescaria Franciscana, fundada em 1871, a Sociedade de pesca a vapor Nossa Senhora do Livramento Lda, que foi criada no dia 25 de Dezembro de 1924, e a Sociedade de Pesca Alentejana Lda (Sociedade Pesca Troia Lda). Constituída em 30 de Março de 1925, determina, "por escritura de 13 de Fevereiro de 1927, lavrada nas notas do notário privativo nesta comarca, [...] Dr. Adriano de Vilhena Pereira da Cruz", que o seu nome foi "substituído para todos os efeitos a contar da data da respectiva constituição, [...], artigo 1º do pacto social da Sociedade de Pesca Alentejana Lda".Estas sociedades de pescadores, tal como as cooperativas, sofriam inúmeras dificuldades tendo em conta as intempéries, a falta de sardinha, o desgaste das embarcações e do material utilizado nas lides da pesca, agravadas pelos impostos que sobre elas recaíam. Assim, em Setembro de 1916, dirigiram ao Ministro da Marinha uma reclamação contra o pagamento por inteiro das chamadas "taxas progressivas", petição que não obteve deferimento. Em 9 de Novembro de 1928, sob o título "Cooperativas", a imprensa local informa que "foi determinado pelo Delegado do Governo junto do Sindicato das Cooperativas, por acordo com o Conselho Administrativo, que se procedesse a um inquérito dos valores existentes nas mesmas", por se terem verificado anomalias nos seus inventários.

Cooperativas de consumo e construçãoEm Janeiro de 1906 verifica-se um movimento tendente à constituição de uma cooperativa de consumo, especialmente de géneros alimentícios, que poderia ser ampliada e inserida no contexto mutualista, visando a venda de outros artigos indispensáveis à vida, em favor dos seus associados. A iniciativa foi acolhida por grande número de pessoas que, de imediato, reuniram num prédio sito na Avenida Luiza Todi, nº 366. Foram lidas e aprovadas "as bases da constituição da sociedade" e "nomeada" a Comissão Administrativa, constituída por Dr. Manuel António Affonso Salgueiro, José Maria da Rosa Albino e Rodolpho Alberto Correia Gonçalves.Em Fevereiro de 1921, a Sociedade Cooperativa de Crédito, Consumo e Edificação "A Corticeira Setubalense" resolveu baixar os preços de alguns géneros existentes no estabelecimento, vendendo a massa a 1$000 réis, o vinho a 560, o feijão colonial a 200, o grão a 480, o bacalhau sueco a 1$700, o feijão espanhol a 700 réis. E, em Julho deste mesmo ano, reduziu 30% no preço do calçado e das fazendas, tendo em conta a "considerável baixa de preços".No dia 2 de Fevereiro de 1927, a imprensa local publicou um aviso/convocatória de uma assembleia geral extraordinária, a realizar no dia 4 de Fevereiro, "pelas 7 horas", a fim de debater o regime provisório de abastecimento de géneros feitos pela Federação Nacional das Cooperativas, apreciar a situação contabilística e reflectir sobre a grande crise de trabalho que atormentava Setúbal.Em 1 de Setembro de 1921 a Cooperativa de Crédito e Consumo dos Empregados e Assalariados do Município de Setúbal comunicava que, a partir daquele dia, o seu estabelecimento de víveres estava aberto ao público na Rua de S. José.A Sociedade Cooperativa Construtora Mutualista realizou, em Janeiro de 1927, um sorteio público de duas habitações. A sessão teve lugar no hall do Asilo Bocage, na presença do Administrador do concelho e da imprensa.
Outras cooperativas e sociedades existentes em SetúbalNuma época em que o "cooperativismo" se impunha, na cidade de Setúbal, pelas suas características, cidade predominantemente industrial, as cooperativas e sociedades proliferaram, pelo que destacaremos apenas as mais citadas na imprensa local, por serem as mais significativas. Assim, a Sociedade Litográfica Portuguesa, no dia 6 de Agosto de 1927 anunciava que nas suas oficinas se realizava estampagem sobre folha-de-flandres e se executavam chaves para latas de conservas em todos os formatos, além de "pregaria diversa"; a Sociedade de Materiais e Conservas, Lda, no dia 6 de Agosto de 1927, informava os fabricantes de Setúbal de que podiam dispor dos seus serviços, como fornecedora de materiais diversos para as suas empresas; a Sociedade Alentejana de Seguros "A Pátria", em 1927 fazia publicidade no Distrito de Setúbal que a recomendava "como sendo uma das mais honestas companhias de seguros"; a Sociedade de Taxis de Setúbal, Lda, no dia 10 de Agosto de 1927, informava, através da imprensa local, de que dispunha de "serviço permanente de taxímetros em esplêndidos automóveis fechados e abertos".
Também, e à semelhança do que se passava no resto país, se estabeleceram, nesta cidade, delegações das associações políticas com sede em Lisboa. Como exemplo citamos, a fundação em Setúbal, em Novembro de 1872, de uma secção da Associação Socialista Produtora do Trabalho Nacional. Foi a "semente" que, de imediato iniciou o seu crescimento para, no dia 5 de Fevereiro de 1900 "dar à luz" O Productor, seguido, em 9 de Dezembro de 1900 de O Trabalho, semanário que se publicou até 1921. No artigo de fundo do primeiro número de O Trabalho, este era visto como uma "[...] ladeira escabrosa e pungitiva por onde hão-de trepar, em busca de sustento, os miseráveis de todas as civilizações passadas e presentes [...]". Havia, pois, que pôr cobro a esta situação humanizando o trabalho e a liberdade que, segundo Oliveira Martins, "quer dizer a eliminação sucessiva de todos os elementos de protecção, religiosa-guerreira, político-comercial, feudal ou burguesa, proprietária ou capitalista, na afirmação do Homem, livre pelos produtos da sua actividade, permutando-os pela federação". Em plena Monarquia, Oliveira Martins lutava pela humanização "do Ideal - Abolição de classes - Perequação de riqueza", que permaneciam perfeitas em sua Alma. Sempre que se dirigia aos poderosos lhes lembrava esta necessidade. Dirigindo-se ao Conde de Sabugosa, perguntou-lhe se os descendentes "da velha raça aristocrática não [poderiam] dar as mãos ao povo seu irmão, sucessor dos grandes ignorados que fizeram a história, unindo-se uns aos outros para a salvação da Pátria?". A sua intenção reformista, assim como a de seus seguidores, era clara em seus escritos e em seus actos, chegando mesmo a aceitar um lugar no Governo, convencido de que assim seria mais fácil fazer valer as suas convicções e mudar a situação da classe trabalhadora. A frustração foi o único resultado da experiência governamental. Assim, concluía que: "O futuro chama-se justiça, a estrada Revolução". Desta revolução nos falam também os jornalistas de O Trabalho, mas são mais precisos nas suas características que apontam claramente para a Revolução Cultural, cujos princípios se clarificam bastante depois da implantação da República, situação que facilitou a expressão das várias ideias que a Monarquia reprimia. Assim, ainda em 1910, Francisco de Noronha esclarecia os trabalhadores de que, sem instrução era impossível alcançar melhores condições de trabalho e, consequentemente, a obtenção de melhores salários: "Associação, sem escola concomitante, de pouco servirá ao empenho de libertação prática e no intuito lógico de melhor futuro. Se uma é a força, a outra não menos deixa de o ser como benéfica luz para guiá-la". Mas, em 1947, ainda António Sérgio lutava por concessão de bolsas de estudo aos mais desfavorecidos, pela criação de mais escolas primárias e secundárias, pelas Universidades Populares, bibliotecas populares, círculos culturais, parques de cultura, radiotelefonia, organizações oficiais de ciclos de conferências, enfim "por processos variadíssimos de alfabetização intensiva [...]" .
Praça do Bocage
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